CAPÍTULO 1 - Generalidades
- 1. Objecto e campo de aplicação:
- 1.1. O presente regulamento tem aplicação obrigatória na Rede Ferroviária Nacional de Angola e tem por objectivo uniformizar procedimentos em situações de perturbação, incidente, acidente ou outras ocorrências no domínio público ferroviário que deixem prever infracções ao Código Penal ou incumprimento de disposições legais e regulamentares aplicáveis à segurança do transporte ferroviário, da circulação ou do ambiente.
- 1.2. O presente regulamento divide-se em duas partes distintas, uma respeitante ao levantamento e preenchimento dos Autos de Notícia e outra à instauração e elaboração de Inquéritos.
- 1.3. Todos os agentes credenciados devem ter pleno conhecimento da legislação aplicável, designadamente deste regulamento, das disposições legais e regulamentares aplicáveis à segurança da circulação e ao ambiente.
- 2. Definições:
- No âmbito do presente documento utilizam-se as seguintes definições:
- Acidente: - Acontecimento súbito, indesejado ou involuntário, ou uma cadeia de acontecimentos dessa natureza, com consequências danosas; os acidentes dividem-se nas seguintes categorias: colisões, descarrilamentos, acidentes em passagens de nível, acidentes com pessoas provocados por material circulante, incêndios e outros.
- Acidente grave: - Qualquer colisão ou descarrilamento de comboios que tenha por consequência, no mínimo, um morto ou cinco ou mais feridos graves, ou «danos significativos» (avaliado em pelo menos USD 1 000 000,00) no material circulante, na infra-estrutura ou no ambiente e qualquer outro acidente semelhante com impacto manifesto na regulamentação da segurança ferroviária ou na gestão da segurança.
- Incidente: - Qualquer ocorrência, distinta de acidente ou acidente grave, associada à exploração ferroviária, sem consequências danosas, mas que afecte negativamente de forma real ou potencial a segurança da exploração ferroviária.
- Ocorrência susceptível de provocar levantamento de Auto ou mesmo Inquérito: - Qualquer facto, distinto de acidente ou incidente, perturbador do bom andamento do serviço ou infracção constante no Anexo I ao presente regulamento.
CAPÍTULO 2 - Autos de Notícia
- 3. Autos de Notícia. Quando devem ser levantados:
- O Auto de Notícia é um documento legal no qual os agentes ajuramentados, no exercício das suas funções, devem evidenciar as ocorrências previstas no presente regulamento, nomeadamente as infracções ao Código Penal contidas no Anexo 1.
- Exceptuando os casos de acidentes de trabalho não abrangidos pelas situações referidas em 3.1 e 3.2 de que sejam vítimas os agentes dos Caminhos-de-Ferro, devem ser levantados Autos de Notícia nos seguintes casos:
- 3.1. Quando dentro dos limites do Caminho-de-Ferro (infra-estrutura, instalações e material circulante) for cometida infracção a qualquer das disposições legais ou regulamentares, designadamente as constantes do Anexo I ao presente regulamento, ainda que o infractor seja trabalhador dos Caminhos-de-Ferro.
- 3.1.1. Nos casos de infracção com interferência de circulação, colhidas, colisões, choques, etc. em que haja Autos de Notícia levantados por agentes da autoridade pública, os agentes ferroviários ajuramentados devem levantar outros Autos de Notícia, contendo obrigatoriamente a indicação da autoridade que tomou conta da ocorrência, e enviá-los aos serviços jurídicos dos Caminhos-de-Ferro (ou da empresa operadora se for o caso).
- 3.2. Em acidentes, incidentes ou ocorrências de que resultem ou possam resultar prejuízos ou responsabilidades para a empresa por parte dos seus trabalhadores ou para terceiros, seja qual for o seu montante.
- 3.3. Em todas as situações que possam constituir a prática de um crime ou a infracção de qualquer natureza da legislação ferroviária, dentro do domínio público ferroviário, sem prejuízo do direito de queixa dos ofendidos.
- 4. Levantamento de Autos de Notícia:
- O Auto de Notícia deve ser levantado pelo agente ajuramentado que presenciou ou constatou, em qualquer momento, ou a quem foi dado conhecimento da ocorrência de infracção, acidente ou incidente. Em caso de ocorrências verificadas no comboio em trânsito, quando não seja possível proceder desta forma, pode, neste caso, o Auto ser lavrado na estação de paragem imediata, pelo respectivo chefe, devendo o agente que presenciou o acontecimento, se for o caso, relatar, circunstanciadamente, para o efeito, os respectivos factos.
- 4.1. Em caso de dúvida de atribuição de competência no estabelecimento do auto, esta é imputada ao agente mais categorizado
- 5. Preenchimento de Autos de Notícia:
- Nos Autos de Notícia devem descrever-se, pormenorizadamente, todos os factos e circunstâncias. No caso de envolverem ofensas de qualquer género devem descrever-se todos os factos cometidos, sem nada omitir, nem mesmo qualquer palavra, frase, acção ou gesto.
- Devem ainda:
- 5.1. Ser lavrados em modelos próprios ou adaptados à falta ou infracção cometida
- 5.2. Mencionar o local e a data do seu levantamento
- 5.3. Conter o nome, número de matrícula, categoria a que pertence o agente ajuramentado que lavra o Auto
- 5.4. Descrever o facto cometido e as condições ou circunstâncias em que foi praticado, com a indicação precisa do dia, hora e local
- 5.5. Mencionar a forma pela qual o agente ajuramentado teve conhecimento da infracção
- 5.6. Designar, sempre que possível, o preceito ou disposição legal infringida, ainda que o infractor ou o responsável haja falecido
- 5.7. Se o agente que levantar o Auto tiver dúvidas acerca do preceito legal que foi infringido, deverá contactar, via telefónica, ou outro meio rápido, as respectivas hierarquias, as quais consultarão, se necessário, os serviços jurídicos da empresa
- 5.8. Identificar, no caso de ofensas, o infractor e o ofendido (nome, idade, estado civil, profissão, naturalidade, residência, telefone(s) ou outros meios de contacto
- 5.9. Indicar, tanto quanto possível, pelo menos duas testemunhas que possam depor sobre o facto que constitui objecto do Auto
- 5.10. Conter as assinaturas do autuante, das testemunhas, do infractor e do ofendido. Caso o infractor se recuse a assinar o Auto, o autuante deve referir tal facto no Auto de Notícia. Quando não seja possível obter a assinatura das testemunhas, o agente que levanta o Auto deverá procurar identificá-las de modo a tornar possível o seu futuro contacto, devendo esses factos e a respectiva razão de não terem sido assinados ser mencionados
- 5.11. Mencionar que se ignora a identidade do autor ou autores da infracção, sempre que esta circunstância se verifique
- 5.12. Apontar a causa, quando possa logo determinar-se
- 5.13. Indicar o responsável ou responsáveis sempre que possível
- 5.14. Mencionar as consequências que estejam à vista (prejuízos materiais e lesões)
- Não devem, em caso algum:
- 5.15. Conter entrelinhas, rasuras ou emendas. Se as tiverem, devem as mesmas ser ressalvadas antes das assinaturas
- 5.16. Ser usadas abreviaturas, sobretudo em relação aos nomes de pessoas, não sendo contudo necessário preencher os números e datas por extenso
- Informação complementar:
- 5.17. Se a ocorrência der lugar a prejuízos ou avarias no material ou nas instalações, atrasos ou supressões, recurso a transportes alternativos ou meios de socorro ou de emergência de qualquer tipo, degradação do ambiente e respectiva reparação, deve ser elaborada nota discriminativa
- 6. Procedimentos complementares a ter em conta no caso de acidentes com veículos terceiros:
- Em caso de acidentes que envolvam veículos estranhos ao Caminho-de-Ferro, nomeadamente rodoviários, independentemente da imputação da responsabilidade dos mesmos, devem ser tidos em conta alguns procedimentos particulares:
- Dos Autos de Notícia, devem também constar;
- Identificação completa do condutor e do proprietário do veículo;
- Matrícula e principais características (marca, modelo e cor) e ainda número da Apólice e da Companhia Seguradora;
- Descrição sumária do acidente, com a indicação do sentido da marcha da composição ferroviária, a velocidade aproximada a que seguia, a indicação de terem sido ou não utilizados os sinais sonoros, o sentido em que seguia o veículo rodoviário.
- Identificação completa do tipo de passagem de nível, quando for o caso:
- classificação, dotação de equipamento de protecção, incluindo a sinalização rodoviária e respectivo estado, funcionalidade dos equipamentos de comunicação, estado do pavimento, se estava guarnecida, independentemente do seu tipo o exigir ou não. Deverão ser referidas outras circunstâncias, tais como a visibilidade, tendo em atenção o sentido e velocidade da marcha do veículo e da composição ferroviária, elementos que possam servir de obstáculo à visibilidade, características do tempo ou outras que a possam comprometer.
- 7. Procedimentos complementares no caso de interrupção da circulação devido a ferido ou cadáver na linha:
- Quando um ferido ou cadáver prejudique a circulação ferroviária, deverão os agentes do caminho-de-ferro adoptar os seguintes procedimentos:
- Apelar para a comparência da autoridade judicial ou policial, se esta não estiver presente, assegurando a guarda do corpo até à sua chegada;
- Requerer, no caso da presença de alguma daquelas autoridades, a adopção das medidas necessárias a normalização da circulação, mantendo-se no local durante essa operação;
- Anotar todas as circunstâncias visíveis referentes ao cadáver, tais como a sua posição, o local, as lesões aparentes, o sexo, etc, ilustrando tais factos com um esboço, devendo ainda ser colhidos e preservados os vestígios existentes, independentemente da presença e dos procedimentos das autoridades;
- Lavrar o respectivo Auto de Notícia com a discriminação de todos os vestígios encontrados no local, com base nas anotações tomadas e nos termos do disposto nos números anteriores.
- 8. Procedimentos a ter em conta em situações particulares dentro do comboio:
- Algumas situações dentro do comboio exigem procedimentos próprios:
- 8.1. Recusa de regularização de situação ilegal:
- Os indivíduos que não sejam portadores de título de transporte e se recusem a regularizar imediatamente a sua situação podem ser expulsos dos comboios na primeira estação em que tal seja possível, sem prejuízo de levantamento dos respectivos Autos.
- 8.2. Em caso de morte no comboio:
- 8.2.1. Sendo associada a causa natural, deve prosseguir a sua marcha até ao apeadeiro ou estação mais próximos onde haja autoridade sanitária, onde serão desenvolvidos os preceitos legais para a remoção do cadáver, devendo a autoridade sanitária local confirmar os procedimentos a observar no veículo ferroviário.
- 8.2.2. Tratando-se de morte em que haja suspeita de crime deve proceder-se à sua comunicação às autoridades nos moldes regulamentares estabelecidos, prestando toda a informação solicitada e seguindo as suas instruções.
- Em qualquer das situações devem ser descritos, nos Autos, todos os factos conhecidos.
- 9. Encaminhamento dos Autos de Notícia:
- Os Autos de Notícia, quer se trate de acidentes, incidentes ou outras ocorrências dentro dos comboios, nas instalações ou em plena via, devem ser lavrados em triplicado:
- Um dos exemplares ficará em poder da empresa que, consoante o caso, lhes dará o tratamento e encaminhamento adequados, incluindo o envio de uma cópia aos operadores ferroviários, que, por sua vez, enviarão cópia ao órgão regulador; os outros dois serão enviados com a urgência possível e dentro do prazo máximo de 10 dias úteis, aos competentes serviços públicos da província e autoridade judicial competente da área onde foi praticada a infracção.
- 9.1. No caso de acidentes com veículos terceiros, deve o Auto ser remetido no prazo de 48 horas, pela via mais expedita, para os serviços jurídicos da empresa.
- 9.2. Posteriormente, o mais rapidamente possível, após análise preliminar das responsabilidades e peritagem dos prejuízos havidos, deve o Auto de Notícia, acompanhado do relatório do acidente, das peritagens efectuadas e, se for caso disso, do período estimado de paralisação do veículo, ser novamente remetido, para os devidos efeitos, aos serviços jurídicos da empresa.
CAPÍTULO 3 - Inquéritos
- 10. Finalidade dos Inquéritos:
Os Inquéritos têm por finalidade o apuramento de factos, qualquer que seja a sua natureza, não sendo do seu âmbito propor procedimentos disciplinares.
São processos que têm em vista a prevenção de acidentes e incidentes, que incluem a recolha e análise de informações, a extracção de conclusões, incluindo a determinação das causas e, se for caso disso, a formulação de recomendações.
- As situações, salvo de Inquérito, são sempre as que decorrem de acidentes ou incidentes e ainda as que deixam pressupor:
- Irregularidades no serviço ou nos procedimentos instituídos, comprometendo o serviço ou a imagem da empresa ferroviária ou ocasionando prejuízos;
- Incumprimento de outras normas regulamentares ou técnicas, provocando ou não prejuízos materiais, ou colocando em risco a segurança das circulações, dos indivíduos ou dos bens materiais e/ou do ambiente.
- 11. Participação das ocorrências para eventual processo de inquérito:
- As participações elaboradas por um trabalhador ferroviário, a partir da comunicação de outrem ou por constatação ou envolvimento directos do próprio, devem ser feitos em documento escrito e dirigidas à respectiva hierarquia que, de imediato, procederá à sua transmissão para os órgãos de acompanhamento dos comboios ou de gestão do tráfego, para tomada das medidas consideradas adequadas.
- Todas as participações devem:
- Ser claras e tão completas quanto for possível;
- Descrever os factos com rigor, mencionando, se conhecidas, todas as circunstâncias de tempo, modo e lugar, incluindo o(s) número(s) dos comboios, tipo de material ou número do sinal envolvidos;
- Indicar o nome do autor ou autores dos factos, idade, estado civil, categoria, número de matrícula e local de trabalho, sempre que sejam conhecidos;
- Dar conta do meio pelo qual o participante tomou conhecimento dos factos;
- Designar as pessoas que possam depor como testemunhas.
- 12. Preservação de provas e dados:
- Os agentes que, em caso de acidente ou incidente ou outra ocorrência, têm a incumbência de restabelecer a normalidade do serviço, devem proceder do seguinte modo, tendo em conta que são os que geralmente primeiro contactam com a situação e a necessidade de preservação de provas e dados para eventuais averiguações, incluindo a realização de Inquérito:
- 12.1. Colher todos os elementos que possam contribuir para o apuramento das suas causas, examinando tudo o que considerarem conveniente e ouvindo as pessoas que tenham testemunhado a ocorrência ou dela tenham tido conhecimento imediato;
- 12.2. Indicar, se possível, a identidade dos passageiros, dos estranhos e dos trabalhadores sinistrados e respectivo grau de sinistralidade;
- 12.3. Referir, quando envolvida uma passagem de nível, o seu tipo, funcionalidade do equipamento, meios de comunicação, estado em que se encontrava anteriormente e em que ficou, além das circunstâncias envolventes;
- 12.4. Examinar cuidadosamente a posição em que a locomotiva e demais veículos ficaram, ou outras particularidades com interesse, sempre que esteja envolvido material circulante;
- 12.5. Mencionar os pontos quilométricos em que a ocorrência teve início e onde terminou;
- 12.6. Elaborar esboço ou esquema donde se depreenda a sua localização exacta e posição relativa dos veículos;
- 12.7. Indicar as avarias causadas nas instalações e no material circulante, os números dos vagões, carruagens e locomotivas;
- 12.8. Fotografar, sempre que possível, a disposição final e estado dos veículos e dos componentes da infra-estrutura e outras instalações, para confirmar todas as situações e particularidades ou circunstâncias envolventes, descritas ou não, sobretudo nas ocorrências envolvendo mortos, feridos ou grandes prejuízos, quer em plena via, passagens de nível ou estações. Nestes casos deve ser registada, pormenorizadamente, toda a envolvente (vegetação, edificações, sinais e indícios de degradação/danificação anormal da infra-estrutura e do material, distância entre elementos em caso de projecção, distância de sinais, visibilidade tendo em conta o ângulo visual do maquinista e das vítimas, etc);
- 12.9. Registar as circunstâncias em que os factos ocorreram, procurando identificar as causas mais directas e visíveis se as houver, quer provenham da infra-estrutura ou sejam devidas à tracção, à gestão da circulação, a manobra indevida de agulhas, a carregamento mal efectuado ou a defeitos do material circulante, etc.
- 12.10. Examinar, se foram atingidos, bens de terceiros, e quais;
- 12.11. Providenciar pela guarda e protecção dos bens abandonados no interior das composições sinistradas de molde a evitar furtos;
- 12.12. Dar conta das medidas adoptadas para restabelecimento da circulação;
- 12.13. Mencionar o tempo durante o qual cada via esteve interrompida, se foi efectuado transbordo e quais as circulações e estações envolvidas, consequências, atrasos registados e circulações afectadas;
- 12.14. Referir o número de trabalhadores participantes no restabelecimento da circulação e respectivas categorias profissionais;
- 12.15. Tomar outras medidas complementares, ainda que fora do local da ocorrência e posteriormente, designadamente a recolha e preservação de todos os tipos de registos de exploração que possam constar nos sistemas de bordo ou da infra-estrutura (comunicações, curvas de aceleração e de frenagem, diferencial de pressões nas condutas do freio, operações de recurso de realização e comando de itinerários e de sinais, etc.) e ainda todos os registos do serviço de circulação dos comboios, imediatamente antes e depois da ocorrência;
- 12.15.1 Também devem ser preservados, de acordo com as normas estabelecidas em regulamentação própria, os documentos que podem clarificar a situação, tais como: modelos de circulação ou outros trocados entre os intervenientes, participações e Autos de Notícia ou cópia (sempre que lavrados).
- 12.16. Providenciar a realização de teste de alcoolemia a todos os trabalhadores envolvidos.
- 13. Decisão para a instauração de inquérito:
- A instauração de Inquérito resulta de proposta dos órgãos mandatados para o efeito ou da administração da empresa, independentemente de qualquer outra iniciativa idêntica determinada pelas entidades oficiais competentes.
- Decidida a instauração de inquérito, devem os órgãos, para tal mandatados, proceder à nomeação da Comissão de Inquérito.
- 14. Nomeação da Comissão de Inquérito:
- A nomeação da comissão de inquérito, a efectuar por despacho, deve designar a composição da mesma com elementos especialistas de todas as áreas envolvidas, o seu presidente e ter em conta o caso específico do tipo de ocorrência a investigar.
- O prazo para a conclusão do Inquérito é de 30 dias, a partir da data em que foi recebido pelo inquiridor ou Comissão de Inquérito o despacho competente.
- Nesta nomeação deve ser indicado esse prazo e explicitado o seu âmbito, podendo ainda ser indicados temas específicos de interesse na investigação, que não devem servir como pretexto para descuidar a restante averiguação, com vista a alcançar um apuramento global de todas as causas e circunstâncias.
- Em casos de acidentes em que se reconheça particular complexidade, no despacho de nomeação da Comissão de Inquérito, pode ser fixado que o prazo de 30 dias seja atribuído a um relatório preliminar, o qual dará por sua vez lugar a um despacho de apreciação, onde se fixará então novo prazo para conclusão do relatório final.
- 15. Constituição da Comissão de Inquérito:
- Na constituição da Comissão de Inquérito devem ser tidos em conta alguns princípios com o fim de alcançar uma investigação objectiva e imparcial, tais como:
- a) equiparação, dentro do possível, entre o nível de qualificação dos inquiridores, sem prejuízo da formação específica exigida para o Inquérito em causa;
- b) exclusão de elementos intervenientes na ocorrência do órgão envolvido ou da sua hierarquia directa.
- 16. Estatuto da Comissão de Inquérito:
- A Comissão de Inquérito é autónoma para desenvolver a sua investigação do modo mais eficaz, podendo:
- Nomear um secretário, que observará, como os restantes membros, o dever de guardar sigilo sobre a matéria do Inquérito;
- Recorrer à consulta de peritos, sempre que disso haja necessidade;
- Proceder a um relatório preliminar nos casos de acidentes graves na circulação dos comboios.
- A Comissão de Inquérito deve ter em conta os seguintes princípios:
- Os Inquéritos são absolutamente confidenciais, não podendo ser revelado qualquer passo das investigações, salvo autorização prévia de entidade competente;
- Deve seguir, logo que nomeada, para o local do acontecimento pelo meio de transporte mais rápido de que possa dispor;
- O prazo para a conclusão do Inquérito pode ser prorrogado, em casos excepcionais e devidamente justificados, por período não superior a 15 dias;
- Essa prorrogação deve ser solicitada pelo Presidente da Comissão de Inquérito em carta endereçada ao órgão que a nomeou;
- As decisões e as conclusões da Comissão de Inquérito devem, tanto quanto possível, ser tomadas por unanimidade. Caso não haja essa unanimidade os elementos da Comissão de Inquérito devem lavrar por escrito as suas divergências, fundamentando-as. Esta fundamentação deve acompanhar o inquérito.
- 17. Processo de inquirição:
- Na inquirição devem ser tidos em conta os seguintes procedimentos:
- 17.1. Nos processos de Inquérito é ilimitado o número de testemunhas a inquirir, cabendo à Comissão decidir do interesse ou necessidade da sua audição.
- A Comissão de Inquérito pode convocar, para audição, os trabalhadores que tenha necessidade de ouvir e solicitar todos os elementos de que careça para as suas averiguações.
- 17.2. A convocação de qualquer trabalhador ao Inquérito será feita por carta dirigida ao superior hierárquico do trabalhador com poder para satisfazer a requisição, a qual deverá ser imediatamente atendida.
- 17.2.1. Em caso de impossibilidade, deve o superior hierárquico do trabalhador informar dos motivos.
- 17.2.2. Sempre que um trabalhador, devidamente notificado ou avisado, não comparecer no dia, hora e local designado, nem justificar a falta, deverá a Comissão de Inquérito notificar a respectiva hierarquia para esclarecimento dos motivos e marcação de nova data.
- 17.2.3. Se os trabalhadores convocados, não se encontrarem ao serviço por motivo de doença ou outro, devem ser convidados a comparecer, por carta registada com aviso de recepção, a expedir directamente pela Comissão de Inquérito.
- 17.2.4. Às testemunhas será perguntado pelo seu nome, nacionalidade, estado civil, profissão e morada e, sendo trabalhadores ferroviários, pelo seu número mecanográfico e categoria. Seguidamente, ser-lhes-á perguntado como tomaram conhecimento dos acontecimentos e serão interrogados acerca dos factos que constituem o objecto do Inquérito, sem omissão de qualquer das circunstâncias que os rodearam no tempo, lugar e modo, como foram praticados bem como sobre as causas que os determinaram e danos produzidos.
- 17.3. Poderão mostrar-se às testemunhas, quando for conveniente, quaisquer peças do processo, documentos que a elas respeitem e quaisquer outros objectos recolhidos durante as averiguações
- 17.4. Às testemunhas será perguntado como souberam o que depõem.
- Se disserem que viram, será perguntado quando e onde, e se estavam presentes outras pessoas que também tivessem visto e quais.
- Se disserem que ouviram, será perguntado a quem o ouviram, quando e onde, e se estavam presentes também outras pessoas que tivessem ouvido e quais, escrevendo-se todas as respostas que interessam à investigação.
- A Comissão de Inquérito deve registar fielmente todo e qualquer depoimento que seja prestado por livre e expressa vontade da testemunha quando interrogada.
- 17.5. Se a testemunha, na ocasião do depoimento, apresentar algum objecto de interesse para a investigação e que se lhe possa exigir, far-se-á no depoimento menção do facto e juntando-o ao processo ou guardando-o devidamente.
- Se o objecto apresentado for algum escrito, será rubricado pelo inquiridor ou Presidente da Comissão de Inquérito e pela testemunha que o apresentar ou, não sabendo escrever, pelo secretário se o houver.
- 17.6. As testemunhas deverão assinar os respectivos depoimentos ou, caso contrário, declarar por que o não fizeram.
- Os depoimentos, antes de assinados, devem ser lidos às testemunhas, fazendo-se menção, no Auto, dessa leitura e de tudo quanto que lhe diga respeito. As testemunhas podem confirmar os seus depoimentos, acrescentá-los, diminui-los, ou fazer-lhes qualquer alteração. De tudo isto se fará menção durante a sequência do depoimento, sem todavia se emendar o que estiver já escrito.
- 17.7. Havendo contradição entre os depoimentos far-se-á a respectiva acareação.
- 18. Relatórios de Inquérito:
- A organização e estrutura dos relatórios dos Inquéritos devem seguir as regras que se seguem, ainda que adaptando o seu conteúdo à complexidade, gravidade e tipo de ocorrência.
- 18.1. Além de expressos com clareza e objectividade, o conteúdo, a forma e a ordem dos assuntos deve ser a seguinte:
- Resumo
- Deve conter uma breve descrição da ocorrência, com indicação da data, local e consequências, causas directas, factores que contribuíram para a ocorrência, bem como as causas subjacentes determinadas pelo Inquérito. Deve ainda citar as principais recomendações, se as houver, e respectivos destinatários
- Factos
- Este ponto deve incluir
- Descrição da ocorrência no tempo, modo e lugar, incluindo a actuação no sentido da normalização da circulação
- Decisão de abrir o Inquérito, composição da Comissão de Inquérito e realização do Inquérito
- Circunstâncias da ocorrência: intervenientes e testemunhas, material e infra-estrutura envolvidos, sistemas de segurança, comunicações, outras circunstâncias envolventes
- Danos humanos e materiais
- Circunstâncias externas: condições atmosféricas e meio envolvente
- Registos
- Este ponto deve comentar todos os registos constantes em anexo
- Resumo dos depoimentos e testemunhos, gestão da segurança ou modos de actuação e procedimentos habituais
- Normas e regulamentação aplicáveis
- Funcionamento do material circulante e instalações técnicas: infra-estrutura, equipamento, sistema de sinalização e de comando e controlo, registos de dados, equipamento de comunicações
- Interacção dos trabalhadores envolvidos, horário de trabalho, outras circunstâncias do factor pessoal com interesse na ocorrência
- Análise e conclusões
- A análise deve documentar-se nos factos apurados para tirar conclusões sobre as causas da ocorrência
- As conclusões devem citar
- As causas directas e imediatas da ocorrência, incluindo os factores que para ela mais contribuíram relacionados com o comportamento e procedimentos das pessoas envolvidas ou com as condições do material circulante, das infra-estruturas e das instalações
- As causas subjacentes relacionadas com as competências, procedimentos, rotinas de manutenção e conservação, condições de trabalho, capacitação, etc.
- As causas mais profundas, relacionadas com as condições do normativo e dos standards, do quadro regulamentar e do nível de aplicação do Sistema de Gestão da Segurança
- Medidas adoptadas
- Se tiverem sido tomadas medidas correctivas em consequência da ocorrência, estas devem ser indicadas e esclarecido se foram adequadas ou não.
- Recomendações
- Se a Comissão de Inquérito assim o entender, após as conclusões, fará proposta das melhorias ao nível organizativo, técnico ou regulamentar que devem ser introduzidas, sem que isso possa ser considerado como factor de causalidade ou dar lugar a uma presunção de culpa
- 18.2. Na verificação dos danos, o apuramento dos prejuízos pode ser feito por estimativa, devendo neste caso ser feita a seguinte referência: «apuramento sujeito a avaliação posterior por dificuldade de apuramento imediato».
Quando não for possível apurar todos os danos e/ou prejuízos deve igualmente ser feita menção desse facto
- Na avaliação devem ser tidos em conta, nomeadamente, os seguintes prejuízos:
- Prejuízos resultantes de danos pessoais (passageiros, trabalhadores ou outros), como por exemplo indemnizações pagas aos sinistrados
- Prejuízos resultantes de danos materiais resultantes de avarias ou perdas de material e equipamento, mercadorias, danos e avarias nas instalações e na infra-estrutura (sinalização, P.N. etc.)
- Indemnizações pagas a clientes ou terceiros, danos ambientais, prejuízos resultantes de perturbações na circulação resultantes de atrasos e supressões, nomeadamente, despesas com transportes alternativos
- Prejuízos resultantes da utilização de meios de socorro, desobstrução e desempanagem
- Prejuízos resultantes da privação do uso/imobilização do material circulante e/ou da infra-estrutura, desde o acidente até à sua integral reparação
- 18.3. Nas conclusões do inquérito, ao discriminar as causas, deve ser claramente expressa a respectiva ordem hierárquica de contribuição para o acontecimento de modo a não suscitar dúvidas. A mesma medida deve ser aplicada às infracções às disposições regulamentares, legais ou de procedimentos
- Devem ser sempre clarificadas as suas causas do acidente, explicitado se ficou a dever-se a causa real, casos fortuitos ou de força maior (violentas intempéries, derrocadas inesperadas, etc). Os relatórios devem ainda referir, com objectividade, se a sua dimensão é devida a anteriores actuações negligentes ou se as consequências do acidente teriam sido impossíveis de evitar
- 19. Apresentação e encaminhamento dos relatórios de Inquérito:
- Os relatórios dos Inquéritos serão de preferência em texto digitado, dactilografado ou manuscritos em letra bem legível e não conterão espaços em branco que não sejam inutilizados, nem entrelinhas, rasuras ou emendas que não sejam ressalvadas.
- 19.1. Os actos dos processos serão sempre assinados e rubricados pelos membros da Comissão de Inquérito e pelo secretário, se o houver, devendo as folhas dos autos ser numeradas e rubricadas.
- 19.2. A Comissão de Inquérito deve enviar o relatório do Inquérito à entidade competente que procedeu à sua nomeação, a qual deve remeter cópia ao órgão regulador.
- 19.2.1. A sua transmissão deve ter um carácter de urgência para a eventual aplicação célere de medidas correctoras urgentes de qualquer tipo, quer sejam apontadas como causa quer como proposta.
- 19.3. Quando os inquéritos não se apresentarem elaborados de harmonia com as regras de organização e de estrutura constantes do presente regulamento, serão devolvidos à Comissão de Inquérito para rectificação. Excepcionalmente, poderá haver lugar a nova nomeação de Comissão de Inquérito.
ANEXO 1 - Designação das Ocorrências Mais Vulgares
- Abrir barreiras das passagens de nível;
- Sem violência ou ameaça para forçar o guarda a abrir as barreiras;
- Com violência ou ameaça, sendo o transgressor que abre as barreiras;
- Com violência ou ameaça, abrindo o guarda as barreiras por força dessa violência ou ameaça;
- Acidente de que os passageiros ou terceiras pessoas sejam vítimas dentro dos limites do Caminho-de-Ferro;
- Acidentes de que resultem avarias no material circulante;
- Acidentes voluntariamente causados, dos quais resultem mortes ferimentos ou avarias;
- Actos que perturbem a boa ordem dos serviços ferroviários ou que incomodem os passageiros;
- Acto do qual possa resultar desastre;
- Angariar passageiros nas estações para outros meios de transporte;
- Apedrejamento ou tiros a comboios;
- Arrombamento de vedações ou de barreiras de PN;
- Avarias causadas nas PN por excessiva largura dos veículos ou a sua carga;
- Colhida de veículos nas PN, encontrando-se as barreiras fechadas, ou havendo sinal de a via estar impedida;
- Colhida de peões em plena via ou em estações;
- Colocar objectos sobre a via que dêem motivo à paragem do comboio;
- Colocar pedras nas agulhas de que resulte ter parado o comboio;
- Construções ou plantações em zonas proibidas;
- Danos voluntários em árvores pertencentes ao CF;
- Danos causados nas instalações de sinalização;
- Danos em edifícios ou estações;
- Dano de coisa de valor consideravelmente elevado;
- Desmoronamentos;
- Furto;
- Homicídio (tentativa);
- Homicídio involuntário;
- Homicídio voluntário;
- Incêndio;
- Moeda (passagem de moeda falsa);
- Morte súbita;
- Ofensas corporais;
- Participação em motim;
- Participação em rixa;
- Pintar carruagens;
- Roubo (subtracção de coisa alheia c/violência);
- Suicídio (incitamento ou ajuda);
- Temporais, inundações ou outros fenómenos de natureza que produzem danos no material, ferimentos ou mortes;
- Transporte de substâncias tóxicas, explosivas ou armas;
- Uso indevido do sinal de alarme;
- Uso de documento de identificação alheio;
- Uso de documento falso;
- Usurpação de coisa imóvel;
- Vender ou oferecer à venda quaisquer artigos nas carruagens ou nas dependências de serviço do Caminho-de-Ferro, sem prévia autorização da empresa;
- Vidros partidos pelos passageiros, ferindo-se outro;
- Violação (crime de) (contra homem ou mulher);
- Observações indicadas na listagem:
- (1) Nos Autos deverá dizer-se: suspeita-se que tenha havido crime.
- (2) Designar sempre convenientemente o acidente.
- (3) O valor das avarias nunca deve mencionar-se no Auto de Notícia.
- (4) Indicar sempre de que lado se produziu o acidente em relação ao sentido da marcha do comboio. É este o único caso em que se lavra Auto de Notícia em quintuplicado, competindo à estação enviar um exemplar à autoridade local que superintende na área onde se verificou o atentado. Os outros quatro exemplares são remetidos à hierarquia respectiva de harmonia com a regra geral.
- (5) Quando alguém for colhido pelo comboio em plena via, deverá mencionar-se se no local havia ou não passagem de nível. Existindo essa passagem, deve dizer-se se ela tem ou não guarda e, tendo guarda, se as cancelas, barreiras ou postigos estavam fechados ou abertos; quando a ocorrência se der em passagem de nível particular, deve sempre constar do Auto de Notícia o nome e a residência do concessionário dessa passagem. Se o infractor tiver falecido não deve mencionar-se a disposição legal infringida.
- (6) Só se deve lavrar auto de notícia quando se verifiquem prejuízos ou vítimas, ou perturbações de importância nos serviços relativos à exploração.
- (7) Indicar sempre a coisa que constitui objecto de furto, assim como a entidade lesada (proprietária, portadora ou detentora do objecto furtado).
- (8) No auto só se indicará que o incêndio foi produzido por faúlhas da locomotiva quando este facto esteja devidamente comprovado. Nos demais casos indicar-se-á que se ignoram as causas do incêndio.
- (9) Mencionar sempre no auto as próprias palavras, frases ou gestos que tenham sido proferidas.
- (10) No auto deve constar sempre:
- «Quando havia lugares na sua classe».
O Ministro, Augusto da Silva Tomás.