CAPÍTULO I
Disposições e Princípios Gerais
Artigo 1.º
Objecto
A presente lei estabelece as bases gerais para dinamizar o cultivo da cana-de-açúcar e de outras plantas, tendo em vista o aproveitamento dos seus produtos, em especial para a produção de biocombustíveis.
Artigo 2.º
Âmbito de aplicação
A presente lei aplica-se à agro-indústria de média e grande escala e a produtores agrícolas que cultivam cana-de-açúcar e outras plantas cuja colheita vendam a projectos agro-industriais de produção de biocombustíveis.
Artigo 3.º
Definições
- Salvo disposição expressa em contrário, para efeitos da presente lei, as palavras e expressões nela usadas têm o significado que se segue:
- a) actividades agro-industriais de biocombustíveis, as actividades económicas relacionadas com o cultivo da cana-de-açúcar e de outras plantas com vista à produção de biocombustíveis;
- b) avaliação de impacte ambiental, o procedimento de gestão ambiental preventiva que consiste na identificação e análise prévia, qualitativa e quantitativa dos efeitos ambientais benéficos e perniciosos de uma actividade proposta, tal como definido na alínea b) do artigo 3.º do Decreto n.° 51/04, de 23 de Julho, Sobre a Avaliação de Impacto Ambiental;
- c) biocombustível, o bioetanol, o biodiesel ou os outros comburentes derivados ou produzidos à base de biomassa;
- d) biodiesel, o combustível derivado de biomassa como, por exemplo, girassol, rícino, soja, dendém, jatrofa, algodão, entre outros, ou de gorduras animais, produzido por transesterificação e usado em motores a combustão interna com ignição por compressão, em qualquer concentração de mistura com o diesel de origem mineral;
- e) biomassa, materiais vegetais, animais e os seus resíduos biodegradáveis;
- f) Certificado de Investimento, o Certificado de Registo de Investimento Privado emitido pela Agência Nacional de Investimento Privado;
- g) entidade agro-industrial de biocombustíveis, a pessoa singular ou colectiva produtora de matéria-prima para biocombustíveis e titular das unidades industriais onde são desenvolvidas as actividades relativas à produção de biocombustíveis;
- h) entidade industrial de biocombustíveis, a pessoa singular ou colectiva detentora de unidade industrial destinada à produção de biocombustíveis;
- i) bioetanol, o combustível derivado de biomassa, obtido através da fermentação de açúcares, a partir de diversas matérias-primas, tais como cana-de-açúcar, trigo, milho, beterraba, uva, mandioca, batata-doce, massango e massambala;
- j) Lei de Terras, a Lei n.° 9/04, de 9 de Novembro;
- k) matérias-primas para biocombustíveis, a cana-de-açúcar e outras plantas, bem como outras prováveis fontes destinadas à produção de biocombustíveis;
- l) produtor agrícola de biocombustíveis, a pessoa singular ou colectiva que desenvolve as actividades de cultivo da cana-de-açúcar e plantas oleaginosas destinadas à produção de biocombustíveis;
- m) produtos e subprodutos, os açúcares, biocombustíveis e derivados resultantes das actividades agro-industriais referidos na presente lei;
- n) projecto agrícola de biocombustíveis, o projecto destinado à produção de cana-de-açúcar e/ou de plantas oleaginosas com vista à produção de biocombustíveis;
- o) projecto industrial de biocombustíveis, o projecto desenvolvido por uma entidade agro-pecuária ou por uma entidade industrial, com vista à produção de biocombustíveis;
- p) terra, o mesmo que terreno, tal como definido, nos termos da alínea j) do artigo 1.º da Lei de Terras, Lei n.° 9/04, de 9 de Novembro;
- q) terras de solos férteis com potencial para a produção agro-alimentar, as terras com aptidão para cultivo de plantas para a produção de alimentos de origem vegetal e animal, utilizadas pelas populações rurais desde a ancestralidade, cuja produção serve de base da dieta alimentar angolana e garante a segurança alimentar do País;
- r) terras de solos pobres para actividade de biocombustíveis, as destinadas ao cultivo de plantas para a produção exclusiva dos biocombustíveis e não utilizáveis pelas populações rurais para cultivo de plantas de produção de alimentos de origem vegetal e animal.
Artigo 4.º
Princípios gerais
- Através da presente lei, o Estado reafirma a necessidade de promover o cultivo da cana-de-açúcar e de outras plantas para a produção de biocombustíveis, orientando-se pelos seguintes princípios:
- a) promover a concessão racional de terras para os projectos de biocombustíveis fora dos limites das terras de solos férteis com potencial para a produção agro-alimentar, evitando, assim, a concorrência e conflitos fundiários entre o cultivo de cana-sacarina e outras plantas para a produção agrária de alimentos e o de iguais plantas para produção exclusiva de biocombustíveis, tendo em consideração as características edafo-climáticas de cada região, fertilidade dos solos e sua respectiva utilização eficiente, assim como a protecção do ambiente;
- b) promover e desenvolver o cultivo da cana-de-açúcar e de outras plantas para a produção de biocombustíveis com vista à promoção do desenvolvimento auto-sustentável do País;
- c) promover o aproveitamento agro-industrial do cultivo da cana-de-açúcar e de outras plantas para a produção de biocombustíveis e a produção e utilização dos seus produtos e subprodutos;
- d) impulsionar a produção agrícola alimentar, atrair investimentos nacionais para as áreas rurais e, consequentemente, promover o povoamento ou repovoamento dessas áreas;
- e) garantir o acesso das comunidades rurais e dos trabalhadores aos benefícios resultantes do desenvolvimento da agro-indústria da cana-de-açúcar e de outras plantas para a produção de biocombustíveis, no âmbito de estratégias de coordenação e integração entre os projectos de biocombustíveis e os de produção agro-alimentar das explorações agrícolas familiares das referidas comunidades rurais e dos empresários agrícolas das respectivas regiões;
- f) promover e fomentar o acesso às terras de solos de fraca fertilidade e pouca aptidão para cultivar cana-de-açúcar e de outras plantas destinadas à produção de biocombustíveis e para a construção das respectivas unidades industriais;
- g) promover a mistura de biocombustíveis aos combustíveis fósseis, com vista à consolidação do bioetanol e do biodiesel, como alternativas complementares para as reservas energéticas do País;
- h) fomentar a produção, distribuição, comercialização e exportação dos principais produtos e subprodutos da cana-de-açúcar e de outras plantas destinadas exclusivamente para a produção de biocombustíveis, sem prejuízo de igual procedimento para os resultantes do cultivo da cana-de-açúcar para a produção de açúcar alimentar, a implementar nas terras de solos férteis com potencial para a produção agro-alimentar;
- i) promover e fomentar a produção de electricidade a partir das biomassas, diversificando a matriz energética nacional.
Artigo 5.°
Incentivos
- 1. Os incentivos a serem concedidos para o exercício das actividades relacionadas com a produção de biocombustíveis são os previstos na Lei n.° 11/03, de 13 de Maio, Lei de Bases do Investimento Privado, na Lei n.° 17/03, de 25 de Julho, Sobre os Incentivos Fiscais e Aduaneiros ao Investimento Privado ou em outros instrumentos legais aplicáveis.
- 2. O Poder Executivo pode atribuir outros incentivos fiscais, cambiais e aduaneiros que se tornem necessários implementar para promover as actividades agro-industriais ligadas aos biocombustíveis, bem como facilidades especiais para a importação das matérias-primas e equipamentos necessários ao exercício das referidas actividades, nos termos a regulamentar.
- 3. O Poder Executivo pode ainda estabelecer mecanismos para impulsionar o financiamento das actividades agro-industriais ligadas aos biocombustíveis, promovendo o acesso directo a créditos, em condições favoráveis.
Artigo 6.º
Órgão de coordenação
- É criada a Comissão de Biocombustíveis que é presidida pelo Ministério dos Petróleos e integra os Ministérios da Coordenação Económica, da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, da Justiça, da Indústria e Geologia e Minas, da Energia e Águas, do Ambiente, a qual é responsável, especialmente por:
- a) promover, em colaboração com os órgãos competentes do Poder Executivo, as actividades agro-industriais;
- b) promover, em colaboração com o Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, o Ministério do Ambiente, o Ministério do Urbanismo e da Construção, Ministério do Interior, o Ministério da Justiça, o Ministério da Administração do Território, Ministério da Indústria e Geologia e Minas e os governos provinciais, estudos necessários à classificação, zonagem, mapeamento e delimitação dos solos cuja terra é objecto das actividades agro-industriais para a produção exclusiva de biocombustíveis;
- c) apoiar o processo de atribuição dos direitos fundiários sobre as terras de solos pobres com potencial para o cultivo de plantas destinadas à produção de biocombustíveis;
- d) promover, em colaboração com os Ministérios da Indústria e Geologia e Minas, do Urbanismo e da Construção, do Ambiente e da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, o processo de classificação, zonagem e mapeamento dos solos e cadastro das terras de solos pobres com potencial para o cultivo de plantas destinadas à produção de biocombustíveis e consequente licenciamento industrial das respectivas actividades agro-industriais;
- e) propor a regulamentação das actividades agro-industriais e industriais ligadas aos biocombustíveis, a qual deve ser emanada por despacho dos órgãos competentes em razão da matéria;
- f) inspeccionar e fiscalizar as actividades agro-industriais, bem como a autuação da ocorrência ou infracção e instrução de processos administrativos e propor a aplicação das concomitantes sanções previstas no presente diploma, no seu regulamento e nos contratos, sem prejuízo dos poderes de inspecção e fiscalização dos demais órgãos competentes;
- g) inspeccionar e fiscalizar as actividades de armazenagem, transporte, distribuição e comercialização dos produtos e subprodutos da cana-de-açúcar e de outras plantas destinadas exclusivamente à produção de biocombustíveis, sem prejuízo dos poderes de inspecção e fiscalização dos demais órgãos competentes;
- h) estimular a pesquisa e investigação científica tendentes à adopção de novas tecnologias para aproveitamento agro-industrial da cana-de-açúcar e de outras plantas destinadas exclusivamente à produção de biocombustíveis, bem como de outras prováveis fontes de biocombustíveis;
- i) promover estudos de aproveitamento e desenvolvimento de projectos agro-industriais e industriais destinados exclusivamente à produção de biocombustíveis;
- j) cooperar nas relações entre o Estado, os produtores agrícolas de alimentos e as entidades agro-industriais e industriais dedicadas, exclusivamente, à produção de biocombustíveis;
- k) propor ao Poder Executivo a criação de infra-estruturas de carácter social para o ordenamento e requalificação rurais, assim como dos assentamentos populacionais das áreas de plantação e cultivo de matérias-primas necessárias às actividades agro-industriais de produção de biocombustíveis;
- l) analisar e emitir parecer sobre os projectos de investimento de actividades agro-industriais ligadas aos biocombustíveis, antes da Agência Nacional de Investimento Privado promover o respectivo processo de aprovação;
- m) promover, em colaboração com o Ministério das Finanças, o processo de fixação de preços e respectivas correcções, alterações e actualizações.
Artigo 7.º
Delimitação, mapeamento, demarcação e concessão de terras
- 1. A delimitação, o mapeamento, a demarcação e a concessão das terras objecto das actividades relacionadas com o presente diploma é da responsabilidade do Instituto de Geodesia e Cartografia de Angola, de acordo com o preceituado na Lei n.° 9/94, de 9 de Novembro, Lei de Terras e no Regulamento Geral de Concessões de Terrenos, aprovado pelo Decreto n.° 58/07, de 13 de Julho.
- 2. A delimitação, o mapeamento, a demarcação e a concessão das terras referidas no número anterior devem observar o disposto na Lei n.° 5/98, de 19 de Junho, Lei de Bases do Ambiente, na Lei n.° 3/04, de 25 de Junho, Lei do Ordenamento do Território e do Urbanismo, na Lei n.° 9/04, de 9 de Novembro, Lei de Terras, as demais normas e regulamentos aplicáveis e antecedida da classificação, zonagem e mapeamento dos respectivos solos em conformidade com o artigo 8.º
Artigo 8.º
Classificação, zonagem e mapeamento dos solos para projectos de biocombustíveis
- 1. A classificação, zonagem e mapeamento dos solos com aptidão para o cultivo de plantas destinadas à produção de biocombustíveis é da competência do Instituto de Investigação Agronómica.
- 2. Para prevenir conflitos entre os produtores agrícolas de alimentos, que utilizam, desde a ancestralidade, terras de solos férteis e os investidores de biocombustíveis, a demarcação e licenciamento das terras previstas neste artigo deve recair, preferencialmente, nas terras cujos solos pobres hajam sido previamente classificados, nos termos do presente artigo.
CAPÍTULO II
Biomassa e seus Derivados
Artigo 9.º
Produtos e subprodutos
- 1. Os organismos competentes devem incentivar a produção e o aproveitamento de todos os produtos e subprodutos das biomassas e envidar esforços para desenvolver o mercado interno com vista à comercialização da produção, assim como incentivar a exportação.
- 2. O Poder Executivo deve estabelecer um prazo a partir do qual passe a ser obrigatória a utilização de biocombustíveis em mistura com combustíveis fósseis ou em sua forma pura, de acordo com as percentagens que forem definidas.
- 3. As actividades agro-industriais realizadas nos termos e nos limites da presente lei beneficiam de alguns dos incentivos previstos nos tratados internacionais de que a República de Angola seja signatária e visem a redução de emissões de gases de efeito estufa.
Artigo 10.°
Especificações dos biocombustíveis
- 1. O Poder Executivo deve definir, por via de decreto, as especificações e os tipos de biocombustíveis a serem produzidos em território angolano, nos termos da presente lei, considerando as especificações e os tipos mais utilizados no mercado internacional.
- 2. Os produtores agrícolas, as entidades industriais, as entidades agro-industriais e os agentes de distribuição e de comercialização de biocombustíveis devem respeitar as especificações estabelecidas pelo Poder Executivo, sob pena de aplicação das sanções previstas na presente lei.
CAPÍTULO III
Outorga de Direitos Fundiários
Artigo 11.°
Outorga das terras
A autorização para constituição de direitos fundiários sobre terrenos para o exercício de actividades agro-industriais ligadas exclusivamente aos biocombustíveis deve observar e respeitar os princípios e as disposições previstos na Lei n.° 3/94, de 25 de Junho, Lei do Ordenamento do Território e do Urbanismo, na Lei n.° 9/94, de 9 de Novembro, Lei de Terras e no Decreto n.° 58/07, de 13 de Julho, Regulamento Geral de Concessão de Terrenos.
Artigo 12.°
Localização dos complexos agro-industriais
A construção de unidades industriais e complexos agro-industriais deve ser feita nos terrenos sobre os quais tenham sido constituídos direitos fundiários para o cultivo da cana-de-açúcar e de outras plantas destinadas exclusivamente à produção de biocombustíveis, com vista à redução dos custos de produção destes.
Artigo 13.°
Direitos fundiários
- 1. Sem prejuízo da possibilidade de outorga do direito de domínio útil civil a entidades agro-industriais, o direito fundiário a atribuir aos produtores agrícolas e às entidades industriais para o exercício de actividades previstas no presente diploma deve ser o direito de superfície, com observância das formalidades previstas na Lei n.° 9/94, de 9 de Novembro, Lei de Terras e no Decreto n.° 58/07, de 13 de Julho, Regulamento Geral de Concessão de Terrenos, para a sua atribuição, com as adaptações constantes dos números seguintes.
- 2. O direito fundiário referido no número anterior é atribuído por um período de 30 anos, renováveis, não podendo o prazo máximo exceder 60 anos, findo o qual os terrenos e os respectivos empreendimentos revertem totalmente a favor do Estado, sem qualquer obrigação deste indemnizar os concessionários.
- 3. O contrato sinalagmático constitutivo do direito fundiário deve conter, de entre outros, os seguintes elementos:
- a) localização e demarcação do terreno objecto do direito fundiário;
- b) duração do contrato e as condições para a sua prorrogação, com a observância do n.° 2 do presente artigo;
- c) programas de trabalho e o volume do investimento previsto;
- d) indicação das garantias a serem prestadas pelos produtores agrícolas, entidades industriais e entidades agro-industriais de biocombustíveis quanto ao cumprimento do contrato e dos programas de trabalho;
- e) regras para contratação de trabalhadores, a serem definidas nos programas de trabalho;
- f) obrigatoriedade do produtor agrícola, da entidade industrial e da entidade agro-industrial de biocombustíveis fornecer, periodicamente, à entidade concedente, os dados e informações relativos à respectiva actividade agro-industrial desenvolvida;
- g) prazo máximo de seis anos para o aproveitamento total e completo da terra objecto do direito fundiário, instalação da fábrica e início da produção;
- h) especificação das regras sobre devolução e desocupação das terras, incluindo retenção ou retirada de equipamentos e instalações;
- i) procedimentos relacionados com a cessão do contrato;
- j) regras sobre resolução de litígios e controvérsias;
- l) casos de rescisão e extinção do contrato;
- m) penalidades aplicáveis no caso de incumprimento das obrigações contratuais;
- n) definição do ente estatal fiscalizador previsto na alínea f) do artigo 6.º, as atribuições e competências dos seus agentes, assim como as formas de o Estado fiscalizar a execução das cláusulas contratuais.
- 4. Os modelos de contrato sinalagmático previstos no número anterior deste artigo devem ser aprovados pelo titular do Poder Executivo por via de decreto legislativo presidencial a constar do regulamento da presente lei.
Artigo 14.°
Trabalhadores angolanos, bens e serviços nacionais
O produtor de biocombustíveis, assim como a respectiva entidade industrial e agro-industrial afim, devem empregar, preferencial e maioritariamente, trabalhadores angolanos e, excepcionalmente, trabalhadores expatriados, assim como utilizar bens e serviços nacionais, nos termos da presente lei e outra legislação vigente.
Artigo 15.°
Titularidade de projectos industriais
- 1. Podem ser concessionários de terras e ou titulares de projectos industriais ligados a biocombustíveis:
- a) empresas públicas e ou associadas com entidades singulares e colectivas angolanas;
- b) pessoas singulares e ou colectivas de nacionalidade angolana;
- c) sociedades comerciais e cooperativas com sede principal e efectiva em Angola;
- d) pessoas singulares de nacionalidade estrangeira e sociedades comerciais com sede principal e efectiva no estrangeiro, sempre em associação com pessoas singulares ou colectivas de nacionalidade angolana, sem prejuízo das restrições estabelecidas na Constituição da República de Angola, na Lei n.° 3/04, de 25 de Junho, Lei do Ordenamento do Território e do Urbanismo e na Lei n.° 9/04, de 9 de Novembro, Lei de Terras.
- 2. Apenas são habilitadas a exercer as actividades previstas na presente lei as pessoas qualificadas, nos termos desta lei que comprovem o cumprimento das exigências estabelecidas pelo órgão competente quanto à qualidade do produto, à produção sustentável e ao licenciamento ambiental de que trata o capítulo VI.
- 3. As pessoas colectivas e singulares referidas no n.° 1 deste artigo devem demonstrar a sua capacidade técnica, económica e financeira para o exercício das actividades industriais, devendo, igualmente, constar do respectivo objecto social, no caso das sociedades comerciais, o exercício de actividades no sector de cultivo ou processamento de cana-de-açúcar e outras plantas para produção de biocombustíveis, bem como outras prováveis fontes de biocombustíveis.
Artigo 16.°
Projectos agro-industriais de produção de biocombustíveis
- 1. Os projectos titulados por entidades agro-industriais de produção de biocombustíveis caracterizam-se por abrangerem grandes extensões de terras contínuas, os quais devem ser constituídos por estruturas integradas, apresentando as seguintes instalações e infra-estruturas de carácter social:
- a) instalações industriais e de apoio à produção;
- b) moradias próximas ao local de trabalho;
- c) creches;
- d) escolas;
- e) hospitais, postos médicos ou centros de saúde;
- f) instalações recreativas e desportivas;
- g) acampamentos com saneamento básico, iluminação, água potável canalizada e habitação condigna para os trabalhadores de baixa renda;
- h) áreas para cultivo de plantas para a produção de alimentos de origem vegetal e criação de gado para autoconsumo.
- 2. As despesas de construção, operação e manutenção das estruturas referidas no número anterior são totalmente suportadas pelos respectivos investidores.
- 3. Os investidores referidos no presente artigo devem co-participar nos esforços do Poder Executivo e das autarquias locais relativamente às despesas com a abertura das vias rodoviárias de acesso, de edificação de estruturas sociais e sanitárias, assim como na implementação de transportes colectivos funcionais, cujos destinos sejam os locais próximos do complexo agro-industrial.
CAPÍTULO IV
Terras para Cultivo de Plantas para a Produção de Alimentos e dos Biocombustíveis
Artigo 17.°
Terras de solos férteis para a produção agro-alimentar
- 1. Consideram-se terras de solos férteis com potencial para a produção agro-alimentar aqueles terrenos já classificados, zonificados e mapeados pelo Instituto de Investigação Agronómica como possuindo aptidão para o cultivo de plantas destinadas à exclusiva produção de alimentos, utilizados pelas populações rurais e empresários agrícolas e cuja produção serve de base da dieta alimentar angolana e garante a segurança alimentar do País.
- 2. Inclui-se na categoria de plantas agro-alimentares prevista no presente artigo o cultivo de cana-de-açúcar destinada, exclusivamente, à produção de açúcar alimentar e melaço.
- 3. As terras com os solos referidos no corpo deste artigo passam a constituir, pela presente lei e demais legislação aplicável, uma reserva estratégica do Estado para uso exclusivo de actividade agrícola intensiva, extensiva, de subsistência e de elevado rendimento, para a produção de alimentos, com vista à erradicação da fome, da pobreza e à obtenção de excedentes constitutivos de reserva alimentar interna e para a exportação.
- 4. O regime de concessão e exploração das terras cujos solos sejam os previstos no presente artigo é o preceituado na Lei n.° 9/04, de 9 de Novembro, Lei de Terras e no Regulamento Geral de Concessões de Terrenos, aprovado por Decreto n.° 58/07, de 13 de Julho.
Artigo 18.°
Terras de solos pobres para actividade de biocombustíveis
- 1. Consideram-se terras de solos pobres com potencial para cultivo de plantas destinadas à produção de biocombustíveis aquelas que para o efeito sejam e ou venham a ser assim classificadas, zonificadas e mapeadas por entidade competente.
- 2. A classificação, zonagem e mapeamento dos solos a que se refere o presente artigo é da competência do Instituto de Investigação Agronómica e deve incidir sobre terrenos que não conflituem com os de solos férteis previstos no artigo anterior.
- 3. As actividades empresariais ligadas à exploração de terras com o objectivo exclusivo de cultivar plantas de produção dos biocombustíveis devem ser exercidas, preferencialmente, nos terrenos de solos previstos no presente artigo.
- 4. O regime de concessão e exploração das terras cujos solos são os previstos no corpo do presente artigo é, com as devidas adaptações, o preceituado na Lei n.° 9/04, de 9 de Novembro, Lei de Terras e no Regulamento Geral de Concessões de Terrenos, aprovado por Decreto n.° 58/07, de 13 de Julho.
- 5. Cabe ao Poder Executivo regular a política de exploração, expansão, contenção e extinção das actividades dos biocombustíveis.
CAPÍTULO V
Direitos e Obrigações dos Investidores e Entidades Ligadas à Produção de Biocombustíveis
Artigo 19.°
Direitos
A aprovação dos projectos de investimento ligados aos biocombustíveis confere ao seu titular o direito de exercer a actividade compreendida no certificado e ou no contrato sinalagmático de investimento, conforme o caso, sem prejuízo dos limites impostos pelas leis aplicáveis.
Artigo 20.°
Obrigações
- 1. São obrigações dos produtores agrícolas, das entidades industriais e das entidades agro-industriais ligados à produção de biocombustíveis, nomeadamente:
- a) sob orientação do Instituto de Investigação Agronómica e do Instituto de Investigação Veterinária, proceder e apresentar estudos detalhados e inventário das espécies vegetais e animais existentes nos terrenos de implantação dos projectos de biocombustíveis, assim como outro estudo de impacte ambiental sobre aquelas espécies de modo a salvaguardar a sua preservação;
- b) respeitar as condições estabelecidas no Certificado de Investimento ou no contrato de investimento, conforme o caso;
- c) obter todas as licenças e autorizações exigidas por lei para o exercício das actividades previstas na presente lei;
- d) fornecer à SONANGOL-E. P., mediante contrato de compra e venda e após notificação do Ministério dos Petróleos, parte da produção destinada à satisfação das necessidades de consumo interno;
- e) submeter-se às acções de fiscalização do Poder Executivo;
- f) cumprir o disposto na Lei Geral do Trabalho e legislação complementar no tocante à contratação de mão-de-obra nacional e estrangeira, bem como as normas de segurança, protecção ambiental e higiene no trabalho;
- g) não ceder ou alienar os direitos e/ou as obrigações conferidas, nos termos da presente lei, sem prévia autorização do Poder Executivo;
- h) não utilizar os terrenos sobre os quais tenham sido constituídos direitos fundiários para fins diversos daqueles a que se destinam;
- i) fornecer todas as informações solicitadas pelos órgãos competentes;
- j) prestar, gratuitamente, assistência médica e medicamentosa aos trabalhadores de baixa renda, assim como aos seus cônjuges, filhos menores e progenitores, comprovadamente sem recursos;
- k) cumprir com as disposições constantes da legislação em vigor sobre seguros relativamente aos trabalhadores;
- l) tratar os lixos e os resíduos resultantes da actividade industrial de produção de biocombustíveis de acordo com os padrões constantes dos tratados internacionais e da legislação angolana sobre o ambiente;
- m) a vedação que delimita os terrenos de cultivo das plantas para biocombustíveis deve respeitar os caminhos vicinais que as populações rurais utilizam para obter água, lenha, carvão vegetal, caça e visitar povoações circunvizinhas;
- n) no pós-projecto deve a autoridade beneficiária realizar a restauração dos solos o mais natural possível.
- 2. Fica proibido o exercício, pelos empregadores, da prática, por acção ou omissão, de actos de discriminação racial, social e salarial entre trabalhadores nacionais e expatriados de igual formação escolar, académica e de equivalente qualificação científica, técnica e profissional.
CAPÍTULO VI
Armazenagem, Transporte, Distribuição e Comercialização
Artigo 21.°
Armazenagem, transporte e distribuição
O exercício das actividades de armazenagem, transporte e distribuição dos biocombustíveis deve, nos termos da presente lei, ser regulamentado pelo Poder Executivo.
Artigo 22.°
Comercialização
Sem prejuízo do disposto na alínea c) do artigo 19.º, a comercialização das matérias-primas, dos biocombustíveis e respectivos produtos e subprodutos é livre, ficando sujeita ao cumprimento das condições estabelecidas na legislação aplicável.
CAPÍTULO VII
Protecção do Ambiente
Artigo 23.°
Avaliação de impacte e licenciamento ambiental
- 1. As actividades de cultivo das plantas, armazenamento e processamento de matérias-primas ligadas aos biocombustíveis, bem como a instalação e a operação de unidades agro-industriais afins, dependem de licença ambiental prévia, nos termos da legislação ambiental aplicável, com as adaptações constantes dos números seguintes.
- 2. A emissão da licença ambiental referida no número anterior fica condicionada à elaboração, pelo interessado e à aprovação pelo órgão competente de uma avaliação de impacto ambiental, conforme o disposto no Decreto n.° 59/07, de 13 de Julho, Sobre o Licenciamento Ambiental e demais legislação em vigor.
- 3. Sem prejuízo do atendimento às demais normas e padrões de protecção do ambiente e dos planos de ordenamento do território previstos na Lei n.º 3/04, de 25 de Junho, as actividades de cultivo de cana-de-açúcar e de outras plantas para a produção de biocombustíveis em áreas inferiores a 10 hectares ficam isentas de licenciamento ambiental.
- 4. A referida isenção não se aplica às situações em que o somatório de duas ou mais áreas objecto de direitos fundiários para o cultivo de cana-de-açúcar e de outras plantas para a produção de biocombustíveis, bem como outras prováveis fontes de biocombustíveis, construção de unidades industriais e complexos agro-industriais, contíguas ou não, ultrapasse o limite referido no número anterior, ainda que os direitos fundiários tenham sido atribuídos a pessoas singulares ou colectivas distintas, caso em que a avaliação de impacto ambiental pode ser conduzida em conjunto, pelos titulares de direitos fundiários, abrangendo as diversas áreas objecto dos referidos direitos.
Artigo 24.°
Infracções e responsabilidade ambiental
- 1. O incumprimento das restrições previstas na presente lei sujeita o infractor a processo e correspectivas sanções administrativas e criminais previstas no capítulo VIII deste diploma e na legislação específica aplicável.
- 2. Sem prejuízo das penalidades administrativas e criminais aplicáveis, o infractor responde, de forma objectiva e solidária com os demais infractores, pelos danos, directos ou indirectos, causados ao ambiente e/ou a terceiros, em decorrência das actividades previstas na presente lei e respectivo regulamento.
- 3. Em respeito ao princípio do poluidor-pagador, 1% dos lucros decorrentes da exploração dos biocombustíveis devem ser investidos no desenvolvimento de projectos ambientais, na investigação científica e tecnológica, assim como na inovação.
CAPÍTULO VIII
Infracções e Sanções
Artigo 25.°
Infracções e sanções
- 1. Sem prejuízo do disposto noutros diplomas legais, constitui infracção o incumprimento das obrigações legais a que o produtor de biocombustíveis e as entidades industriais e agro-industriais afins estão sujeitos, nos termos da presente lei.
- 2. Constitui infracção, nomeadamente:
- a) o não recrutamento, emprego e formação escolar, técnica e profissional do pessoal angolano, bem como a não utilização de bens e serviços nacionais;
- b) a cedência ou alienação dos direitos atribuídos, nos termos da presente lei;
- c) a prática de outras actividades fora do âmbito do projecto autorizado;
- d) o incumprimento do previsto no n.° 1 do artigo 16.°;
- e) a falta de informação referida na alínea h) do artigo 20.°;
- f) a prática de discriminação racial, salarial, social e habitacional entre trabalhadores nacionais e expatriados de igual habilitação escolar e académica, assim como de equivalente formação técnica e profissional, nos termos da presente lei, da Lei Geral do Trabalho e demais legislação aplicável.
- 3. A responsabilização pelas infracções previstas na presente lei não isenta o agente de responsabilidade civil, penal, fiscal ou de qualquer outra natureza, prevista na presente lei, na Lei Geral do Trabalho e na legislação aplicável.
Artigo 26.°
Sanções
- 1. Sem prejuízo de outras sanções especialmente previstas na presente lei, as infracções referidas no artigo anterior são passíveis das seguintes sanções:
- a) multa, que varia entre Kz: 100 000,00 e Kz: 1 000 000,00, sendo o mínimo e o máximo elevados para o triplo, em caso de reincidência;
- b) perda de isenções, incentivos fiscais e aduaneiros e outras facilidades concedidas;
- c) revogação da autorização do exercício das actividades compreendidas no contrato de investimento ou no certificado de investimento, assim como da sua concomitante cassação.
- 2. A não execução das actividades referidas na alínea c) do número anterior dentro dos prazos e limites materiais fixados no certificado de investimento, no contrato de investimentos ou na respectiva prorrogação, é passível da sanção prevista na alínea b) do número anterior.
- 3. A violação das cláusulas previstas nos artigos 20.º a 22.º da presente lei, implica responsabilidade criminal punível como desobediência qualificada, sendo punido como crime contra a segurança alimentar, punível com a pena de dois a oito anos, previsto no artigo 24.º, consoante a gravidade.
Artigo 27.°
Competência para aplicar sanções
As sanções previstas no artigo anterior são, mediante instauração de competente processo, aplicadas pela Agência Nacional de Investimento Privado.
Artigo 28.°
Procedimentos e recurso sobre sanções
- 1. Antes da aplicação de qualquer medida sancionatória, o produtor de biocombustíveis, a entidade industrial e ou agro-industrial afim, deve, mediante autuação prévia da ocorrência e ou infracção, ser obrigatoriamente ouvido em processo instaurado e instruído com a estrita e rigorosa observância do procedimento administrativo previsto na legislação administrativa e judicial aplicável.
- 2. Na determinação da sanção a aplicar, devem ser tomadas em consideração todas as circunstâncias atenuantes e agravantes que rodearam a prática da infracção, o grau de culpabilidade, os benefícios pretendidos e obtidos com a prática da infracção e os prejuízos daí resultantes.
- 3. O produtor de biocombustíveis, a entidade industrial e ou agro-industrial afim pode reclamar ou recorrer da medida sancionatória, nos termos da legislação em vigor.
CAPÍTULO IX
Disposições Finais e Transitórias
Artigo 29.°
Regime aplicável
- 1. A produção dos biocombustíveis é feita nos termos da presente lei e da legislação complementar, ressalvadas as disposições especiais previstas neste diploma, aplicáveis às actividades que sejam de pequenos produtores.
- 2. O disposto no número anterior não prejudica a validade e conteúdo das licenças ou autorizações já concedidas à data da publicação da presente lei, que se mantêm válidas, aplicando-se, no entanto, ao exercício das actividades previstas no presente diploma, o regime jurídico aqui estabelecido.
- 3. A presente lei aplica-se aos pedidos de autorização de investimento e aos pedidos de atribuição de direitos fundiários para o cultivo da cana-de-açúcar e de outras plantas, construção de unidades industriais e complexos agro-industriais para actividades de biocombustíveis, pendentes à data da sua entrada em vigor, cabendo aos requerentes alterar o respectivo pedido, em conformidade com as disposições da presente lei.
Artigo 30.°
Uso e aproveitamento da água
O uso e aproveitamento da água para os projectos agro-industriais de cultivo da cana-de-açúcar e de outras plantas para actividades de biocombustíveis estão sujeitos ao regime previsto na Lei n.° 6/02, de 21 de Junho, Lei das Águas.
Artigo 31.°
Seguros e cauções
- 1. Os produtores agrícolas, as entidades industriais e as entidades agro-industriais ligados aos biocombustíveis devem constituir e manter, durante todo o período do respectivo projecto, um seguro de responsabilidade civil proporcional ao potencial de risco inerente às actividades agro-industriais por eles desenvolvidas.
- 2. Aos produtores agrícolas, às entidades industriais e às entidades agro-industriais referidos no número anterior pode ser exigida a prestação de caução, a definir em legislação complementar, destinando-se, nomeadamente a:
- a) facilitar a reposição do equilíbrio ambiental;
- b) fazer face a situações de emergência relacionadas com a salvaguarda de pessoas e bens.
Artigo 32.°
Regulamentação
A presente lei deve ser regulamentada pelo Poder Executivo no prazo de 180 dias.
Artigo 33.°
Dúvidas e omissões
As dúvidas e as omissões suscitadas pela interpretação e aplicação da presente lei são resolvidas pela Assembleia Nacional.
Artigo 34.°
Norma revogatória
É revogada toda a legislação que contrarie o disposto na presente lei.
Artigo 35.°
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor 30 dias após a sua publicação.
Vista e aprovada pela Assembleia Nacional, em Luanda, aos 24 de Março de 2010.
O Presidente da Assembleia Nacional, António Paulo Kassoma.
Promulgado em 23 de Abril de 2010.
Publique-se.
O Presidente da República, JOSÉ EDUARDO DOS SANTOS.