CAPÍTULO I
Criação e fins
Artigo 1.º
Criação
É criada pelo presente diploma, a Sala do Julgado de Menores, Órgão Jurisdicional de competência especializada, integrado ao Tribunal Provincial da Província onde se encontre, adiante designada «Julgado de Menores».
Artigo 2.º
Fins
O Julgado de Menores tem por fim assegurar aos menores sujeitos à sua Jurisdição a protecção Judiciaria, a defesa dos seus direitos e interesses e a protecção legal que lhe é concedida pela Lei Constitucional, mediante a aplicação de medidas tutelares de vigilância, assistência e educação.
Artigo 3.º
Âmbito de Jurisdição
- Estão sujeitos à Jurisdição do Julgado de Menores:
- a) os menores que se encontrem em qualquer das situações descritas na presente lei;
- b) os pais, tutores ou quem tenha o menor a seu cargo, nos casos previstos na presente lei;
- c) todo aquele que pratique acto que constitua violação dos deveres de protecção social do menor.
CAPÍTULO II
Composição e Órgãos que o Integram
Artigo 4.º
Constituição
- 1. O Julgado de Menores é o órgão colegial, composto por um Juiz especializado coadjuvado por dois peritos assessores que podem ser funcionários da Administração do Estado ou representantes da sociedade civil.
- 2. A decisão é proferida pelo Juiz depois de ouvido o parecer dos Peritos Assessores.
Artigo 5.º
Peritos assessores
- 1. Os Peritos Assessores são nomeados pelo Ministro da Justiça, pelo período de 3 anos e serão escolhidos preferencialmente entre funcionários dos serviços de assistência social, educação, saúde ou pessoa da sociedade civil de reconhecida Idoneidade.
- 2. Os Peritos Assessores são nomeados entre quem preencha os seguintes requisitos:
- a) ter reconhecida idoneidade moral e cívica;
- b) ter idade superior a 24 anos;
- c) residir na área onde o Julgado de Menores vai exercer as suas funções;
- d) possuir como habilitações literárias mínimas a 12ª classe ou equivalente;
- e) ter comprovada experiência em matéria que se relacione com o menor.
- 3. Os Peritos Assessores estão sujeitos às mesmas incompatibilidades, impedimentos e sujeições a que estão sujeitos os juízes.
Artigo 6.º
Atribuições do juiz
Incumbe ao juiz do Julgado de Menores preparar e decidir em primeira instância os processos sujeitos à sua Jurisdição, bem como os respectivos incidentes e exercer as demais atribuições consignadas na lei.
Artigo 7.º
Procurador de menores
- 1. Os Magistrados do Ministério Público que exerçam funções nos Julgado de Menores são designados Procuradores de Menores.
- 2. Compete ao Procurador de Menores representar Judicialmente o menor assim como defender os seus direitos e zelar pelos seus interesses, podendo exigir aos pais, tutores ou pessoas encarregadas da sua guarda os esclarecimentos necessários.
Artigo 8.º
Serviços sociais
- 1. O Julgado de Menores integra na sua estrutura serviços sociais para o exercício da sua Jurisdição.
- 2. Nas províncias em que não for possível a constituição dos serviços sociais, pode o Julgado de Menores requisitar a outros órgãos da Administração do Estado, funcionários habilitados para o exercício das respectivas atribuições.
- 3. Cabe no geral aos serviços sociais proceder a averiguação dos factos necessários à decisão e o acompanhamento e cumprimento das decisões proferidas.
Artigo 9.º
Legitimidade
- Têm legitimidade para o procedimento Judicial:
- a) o Procurador de Menores;
- b) as autoridades policiais tradicionais;
- c) os pais, tutores ou quem tenha o menor a seu cargo;
- d) quem no exercício das suas funções tenha conhecimento do facto sujeito à competência do Julgado de Menores;
- e) os representantes de pessoas jurídicas cujo objecto seja a protecção do menor, que no exercício da sua actividade tenham conhecimento do facto da competência do julgado de Menores.
CAPÍTULO III
Das medidas tutelares e de protecção social
Artigo 10.º
Natureza das medidas
- 1. Podem ser aplicadas singular ou cumulativamente, aos menores sujeitos a Jurisdição do Julgado de Menores, as medidas tutelares de protecção, assistência ou educação previstas nesta lei.
- 2. O Julgado de Menores deve, de acordo com as circunstâncias de cada caso, aplicar as medidas adequadas a protecção do menor.
Artigo 11.º
Revisão de decisões
As decisões relativas ao arquivamento dos autos, a suspensão da medida ou do processo e a aplicação, alteração ou cessação de medidas tutelares podem ser a todo o tempo revistas, com vista à mais fácil reintegração social do menor ou em virtude de se não ter conseguido a execução prática da medida decretada.
Artigo 12.º
Espécie de medida
- Compete ao Julgado de Menores:
- a) aplicar medidas de protecção social aos menores de qualquer idade;
- b) aplicar medidas de prevenção criminal aos menores com idade compreendida entre os 12 e os 16 anos de idade, exclusivé.
Artigo 13.º
Medida provisórias
- 1. Quando a urgência da situação assim o exigir ou se torne imprescindível ao Julgado de Menores, a recolha de informações, este pode decretar medidas de natureza provisória.
- 2. As medidas de natureza provisória não podem ser aplicadas por período superior a três meses e só por razões ponderosas podem ser prorrogadas por igual período de tempo.
Artigo 14.º
Aplicabilidade das medidas de protecção social
- As medidas de protecção social são decretadas, quando esteja em perigo o bem estar físico ou moral do menor, designadamente, quando ocorra qualquer das seguintes situações:
- a) Sejam vítimas de maus tratos físicos, morais ou de negligência por parte de quem os tenha à sua guarda;
- b) se encontrem em situação de abandono ou desamparo;
- c) se mostrem gravemente inadaptados à disciplina da família e de comunidade;
- d) sejam utilizados como mão de obra e estejam sujeitos a esforços físicos susceptíveis de causar lesões graves;
- e) se dediquem à mendicidade, vadiagem, prostituição e libertinagem, ou façam uso de bebidas alcoólicas ou de estupefacientes.
Artigo 15 .º
Enumeração das medidas de protecção social
- As medidas de protecção social são, entre outras, as seguintes:
- a) permanência em casa dos pais ou tutores ou outros responsáveis mediante acompanhamento do Julgado de Menores;
- b) imposição de regras de conduta;
- c) colocação em família substituta;
- d) matrícula e frequência obrigatória em estabelecimento de ensino;
- e) inscrição em centro de formação profissional;
- f) requisição de assistência médica, de testes psicotécnicos ou outros;
- g) semi internamento em estabelecimento de assistência ou educativo;
- h) internamento em estabelecimento de assistência ou educativo.
Artigo 16.º
Aplicabilidade das medidas de prevenção criminal
As medidas de prevenção criminal são aplicáveis aos menores que pratiquem factos tipificados na lei como delitos.
Artigo 17.º
Enumeração das medidas de prevenção criminal
- As medidas de prevenção criminal são as seguintes:
- a) repreensão;
- b) imposição de regras conduta;
- c) condenação do menor ou do seu representante legal, em multas, indemnizações ou restituições;
- d) prestação de serviços à comunidade;
- e) liberdade assistida;
- f) semi internamento em estabelecimento de assistência ou educativo;
- g) internamento em estabelecimento de assistência ou educativo.
CAPÍTULO IV
Protecção Social do menor
Artigo 18..º
Vinculação do direito de protecção social do menor
- 1. Constitui violação do dever de protecção social ao menor a prática de qualquer dos seguintes acto:
- a) o não cumprimento, por parte dos pais, tutores ou pessoa que tenha o menor a seu cargo, das medidas de protecção social ou de prevenção criminal, impostas ao menor;
- b) a ordem de saída do menor da residência familiar, não autorizada pelo Julgado de Menores, por parte dos pais, tutores ou qualquer pessoa que tenha o menor a seu cargo;
- c) a identificação pelos meios de comunicação social, da pessoa do menor a quem seja atribuída a prática de facto tipificado na lei penal como crime, ou que seja ofendido em crime de natureza sexual;
- d) a utilização pelos meios de comunicação social da pessoa do menor para narração do facto susceptível de desencadear o ódio, frustrações ou traumatismo de natureza pessoal ou familiar;
- e) a permissão de entrada de menores em casas de diversão, de espectáculos ou de Jogos impróprios para menores e a falta de afixação no exterior do edifício da natureza dos mesmos e das faixas etárias que se destinam;
- f) venda, entrega ou exposição à menores de revista e cassetes ou qualquer outro material gráfico, visual ou auditivo, com carácter pornográfico ou que incentive o uso ilícito de estupefacientes ou de armas de guerra;
- g) exibição pelas cadeias de rádio e televisão, dentro das horas consideradas próprias para o público infanto juvenil, de programas de violência física ou moral ou de sexo;
- h) permanência de menor com idade inferior a 16 anos em casas de diversão para além das 0 horas.
- 2. A violação do disposto no número anterior faz incorrer o seu autor em contravenção cujo conhecimento é da competência do Julgado de Menores.
Artigo 19.º
Medidas aplicáveis
- 1. Os factos previstos no Artigo anterior estão sujeitos às seguintes sanções:
- a) advertência;
- b) multa a fixar entre o limite do salário mínimo e máximo anual da função Pública;
- c) proibição do exercício da actividade por 10 dias, ou multa correspondente;
- d) indemnização a favor do menor por danos morais;
- e) proibição do exercício da actividade até dois anos.
- 2. Quando o facto praticado pelos pais, tutores ou pessoa que tem o menor a seu cargo revelar necessidade de se alterar o exercício da autoridade paternal será dado cumprimento ao previsto no Artigo 23..º da presente lei.
CAPÍTULO V
Recursos
Artigo 20.º
Tribunais de recursos
- Das decisões do Julgado de Menores cabe recurso:
- a) para a câmara do Cívil e do Administrativo do Tribunal Supremo, das que apliquem medidas de protecção social ao menor;
- b) para a câmara dos Crimes Comuns do Tribunal Supremo, das que apliquem medidas de prevenção criminal ao menor;
- c) para a câmara do Cívil e Administrativo do Tribunal Supremo das que apliquem medidas por contravenção por violação do dever de protecção social do menor.
CAPÍTULO VI
Participações
Artigo 21.º
Participação criminal
Quando se apure a prática de facto que constitua infracção penal cometida contra menor, o Julgado de Menores deve dele dar conhecimento ao representante do Ministério Público junto do Tribunal competente para procedimento.
Artigo 22.º
Participação à sala da família
Quando o julgado de Menores aplicar medida que envolva alteração ou inibição do exercício da autoridade paternal, deve dar conhecimento do facto ao Ministério Público Junto da sala da família para procedimento.
Artigo 23.º
Comunicação ao julgado de menores
A condenação pela sala dos crimes comuns de menores de 18 anos deve ser obrigatoriamente comunicada ao Julgado de Menores competente.
CAPÍTULO VII
Defesa do menor
Artigo 24.º
Constituição de advogado
- 1. Os pais, tutores, qualquer pessoa que tenha menores a seu cargo e o menor com idade superior a 16 anos de idade podem constituir advogado para intervir no processo.
- 2. Os interessados que não disponham de recursos económicos, podem requerer ao Julgado de Menores que lhe seja atribuído o benefício da assistência judiciária.
Artigo 25.º
Confidencialidade
- 1. Os processos da competência do Julgado de Menores são de natureza confidencial e não podem ser usadas em desfavor da pessoa do menor.
- 2. A sua consulta por terceiros pode ser autorizada pelo juiz quando o fim, de natureza científica, estatística ou outro, o justifique.
- 3. A violação da confidencialidade dos processos e a utilização das certidões para fins diversos dos constantes do número anterior, constituem crime de desobediência.
CAPÍTULO VIII
Da comissão tutelar de menores
Artigo 26.º
Natureza e constituição
- 1. A Comissão Tutelar de Menores é um órgão permanente e autónomo, não jurisdicional, a quem cabe, em estreita colaboração com o Julgado de Menores, encaminhar os menores sujeitos sua jurisdição e cooperar na execução das suas decisões.
- 2. Em cada Província é instituída uma Comissão Tutelar de Menores integrada por cinco membros, dos quais três são designados pelo Ministério da Assistência e Reinserção Social e os outros designados pelo instituto Nacional da Criança.
Artigo 27.º
Atribuições da Comissão tutelar
- 1. São atribuições da Comissão Tutelar de Menores:
- a) encaminhamento do menor ao Julgado de Menores prestando toda a informação pertinente;
- b) acompanhamento do menor sujeito a medidas provisórias;
- c) acompanhamento e execução das medidas decretadas pelo Julgado de Menores para a sua efectivação.
- 2. No exercício das suas funções a Comissão Tutelar de Menores pode:
- a) fazer declaração para registo de nascimento quando ele for omisso;
- b) prestar apoio aos representantes do menor, na obtenção do registo de nascimento;
- c) solicitar às Conservatórias do Registo Civil, certidões de registo necessárias ao desempenho das suas funções.
- 3. Quando o Julgado de Menores aplicar a medida de semi-internamento ou internamento em estabelecimento de assistência ou educativo, cabe à Comissão Tutelar de Menores excutá-Ia, depois de transitada em julgado.
- 4. Tratando-se da aplicação de qualquer outra medida, o Julgado de Menores decide sobre a intervenção ou não da Comissão Tutelar de Menores.
CAPITULO IX
Disposições finais e transitórias
Artigo 28.º
Revogação de legislação
É revogado o Capitulo III da Lei n.º 7/80, de 27 de Agosto e demais legislação que contrarie o disposto na presente lei.
Artigo 29.º
Regulamentação
A presente lei deve ser regulamentada pelo Governo no prazo de 90 dias após a sua publicação.
Artigo 30.º
Dúvidas e omissões
As dúvidas e omissões suscitadas na interpretação e aplicação da presente lei, são resolvidas pela Assembleia Nacional.
Artigo 31.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor à data da sua publicação.
Artigo 32.º
Disposição transitória
Enquanto não estiverem reunidas as condições de funcionamento do Julgado de Menores, a competência que lhe é atribuída na presente lei é exercida pelo Juiz Presidente do Tribunal Provincial ou por quem este designar.
Vista e aprovada pela Assembleia Nacional.
Publique-se.
Luanda, aos 30 de Novembro de 1995.
O Presidente da Assembleia Nacional, Fernando José de França Dias Van-Dúnem.
O Presidente da República, JOSÉ EDUARDO DOS SANTOS.