As profundas transformações que se vêm operando em Angola vão determinando cada vez mais a tomada de medidas tendentes à consolidação da democracia e do Estado de Direito;
Neste âmbito, inscreve-se a presente Lei, que deverá constituir um instrumento necessário para a protecção geral dos cidadãos contra eventuais erros, excessos ou abusos dos órgãos públicos, por virtude de tomada de decisões executórias ou deliberações administrativas violadoras da lei;
Nestes termos, ao abrigo do disposto no Artigo 43.° e na alínea b) do Artigo 88.º da Lei Constitucional, a Assembleia Nacional aprova a seguinte:
CAPÍTULO I
Das disposições gerais
Artigo 1.°
Dos actos administrativos
- 1. São actos administrativos os praticados no exercício das suas funções pelos órgãos da administração central e local do Estado e pelos órgãos de direcção das pessoas colectivas de direito público.
- 2. Consideram-se, para efeitos da presente Lei, pessoas colectivas de direito público os serviços personalizados do Estado e os estabelecimentos públicos.
Artigo 2.°
Das acções administrativos
- 1. São susceptíveis de apreciação contenciosa as acções derivadas de contratos de natureza administrativa.
- 2. Os factos de que resultem responsabilidade extra-contratual dos órgãos e organismos mencionados no Artigo 1.º, são apreciados em processos de natureza cível.
Artigo 3.º
Dos contratos administrativos
São contratos administrativos os celebrados pelos órgãos e organismos referidos no Artigo 1.º, no exercício das suas funções de administração, para fins de utilidade pública.
Artigo 4.º
Das omissões administrativas
Podem ainda ser impugnados por meio de reclamação ou de recurso as omissões dos órgãos referidos no Artigo 1.º, nos casos em que lhes coubesse o dever legal de agir na protecção dos direitos gerais da comunidade, do meio ambiente ou da conservação da natureza.
Artigo 5.º
Dos poderes delegados
Consideram-se como proferidos pela autoridade que conferiu o poder, os actos administrativos dimanados de autoridade hierarquicamente inferiores no uso de poderes delegados.
Artigo 6.º
Da Impugnação
Os actos administrativos de carácter definitivo e executório, feridos de ilegalidade ou lesivos de direitos adquiridos, podem ser impugnados por meio de reclamação ou de recurso administrativo.
Artigo 7.°
Fundamento
Constitui fundamento de impugnação dos actos administrativos, a ilegalidade que se pode consubstanciar na violação da lei, incompetência, vício de forma, desvio de poder e usurpação de poder.
Artigo 8.°
Das exclusões
- 1. Não são passíveis de impugnação:
- a) os actos administrativos que sejam a confirmação de outros;
- b) os actos administrativos proferidos em processos de natureza disciplinar, laboral, fiscal ou aduaneiro ou de natureza cível que estejam afectos à jurisdição própria;
- c) os actos de natureza política.
- 2. Consideram-se actos de natureza política os praticados no exercício escrito da função política do Estado, nomeadamente, os constantes dos Artigos 66.º, 88.º, 110.º e 114.º da Lei Constitucional.
CAPÍTULO II
Da impugnação dos actos administrativos
Artigo 9.°
Das modalidades
- A impugnação dos actos administrativos pode ser feita por meio de:
- a) reclamação, dirigida ao órgão de que dimana o acto;
- b) recurso hierárquico, dirigido ao órgão hierarquicamente superior ao que proferiu o acto ou de tutela;
- c) recurso contencioso, interposto junto do tribunal competente.
Artigo 10.
Dos antes da fundamentação
Só os fundamentos de facto e de direito invocados para a reclamação e para o recurso hierárquico, podem constituir causa para o recurso contencioso.
Artigo 11.°
Do objecto
- 1. A impugnação dos actos administrativos por via de reclamação ou recurso hierárquico tem por objecto a sua revogação ou alteração.
- 2. A impugnação dos actos administrativos por recurso contencioso tem por objecto a declaração da sua invalidade ou anulação.
Artigo 12.°
Da precedência obrigatória
- O recurso contencioso é obrigatoriamente precedido de:
- a) reclamação, quanto aos actos administrativos de membros do governo, governadores provinciais e administradores municipais;
- b) recurso hierárquico, quanto aos actos dos órgãos hierarquicamente inferiores aos mencionados na alínea anterior e dos órgãos directivos das pessoas colectivas e institutos de direito público.
Artigo 13.º
Dos prazos
- 1. O prazo para a impugnação por via de reclamação ou de recurso hierárquico é de 30 dias.
- 2. O prazo para o recurso contencioso é de 60 dias.
Artigo 14.º
Da contagem de prazos
- 1. A contagem do prazo para reclamação ou recurso hierárquico opera-se a partir da data da notificação do acto ou da sua publicação.
- 2. A contagem do prazo para o recurso contencioso opera-se a partir da notificação da decisão que recair sobre a reclamação ou o recurso hierárquico.
- 3. Se no prazo de 60 dias não for proferida decisão por quem tenha o dever legal de o fazer, considera-se tacitamente indeferida a reclamação ou o recurso. Neste caso, o interessado tem o direito ao recurso hierárquico ou contencioso, conforme o caso.
CAPÍTULO III
Da função jurisdicional
Artigo 15.º
Da competência
Compete ao Tribunal Supremo e aos Tribunais Provinciais, conhecer dos recursos e acções previstos nesta Lei.
Artigo 16.º
Do plenário
- Compete ao Plenário do Tribunal Supremo, além das demais espécies de recursos previstos na lei conhecer:
- a) dos recursos dos acórdãos preferidos pela Câmara do Cível e Administrativo em 1.ª instância;
- b) dos actos administrativos do Presidente da República, do Presidente da Assembleia Nacional, do Governo, do Chefe do Governo e do Presidente do Tribunal Supremo.
Artigo 17.º
Da Câmara do Cível e Administrativo
- Compete a Câmara do Cível e Administrativo do Tribunal Supremo conhecer:
- a) dos recursos dos actos administrativos dos membros do governo, dos governadores provinciais e das pessoas colectivas do direito público de âmbito nacional;
- b) das acções derivadas de contratos de natureza administrativa, celebrados pelos órgãos e organismos referidos no Artigo 1.º;
- c) dos outros recursos e acções que lhe sejam cometidos por lei.
Artigo 18.º
Da Sala do Cível e Administrativo
- Compete a Sala do Cível e Administrativo do Tribunal Provincial conhecer:
- a) dos recursos dos actos administrativos dos órgãos locais do poder do Estado, abaixo do Governador Provincial, das pessoas colectivas de direito público e das empresas gestoras de serviços públicos de âmbito local;
- b) das acções derivadas de contratos de natureza administrativa celebrados pelos órgãos e organismos referidos no número anterior;
- c) de outros recursos e acções que lhe sejam cometidas por lei.
Artigo 19.º
Do alargamento de Jurisdição
A título transitório, pode ser alargada a mais de uma província a jurisdição da Sala do Cível e do Administrativo de um Tribunal Provincial.
CAPÍTULO IV
Das disposições finais
Artigo 20.°
Da revogação de legislação
É revogada toda a legislação que contrarie o disposto na presente lei.
Artigo 21.º
Da interpretação
As dúvidas e omissões que surgirem na interpretação e aplicação da presente lei são resolvidas pela Assembleia Nacional.
Artigo 22.º
Da regulamentação
A presente lei deve ser regulamentada pelo Governo no prazo de 90 dias após a sua publicação.
Artigo 23.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor na data da sua publicação.
Vista e aprovada pela Assembleia Nacional.
Publique-se.
Luanda aos 14 de Janeiro de 1994.
O Presidente da Assembleia Nacional, Fernando José de França Dias Van-Dúnem.
O Presidente da República, José Eduardo dos Santos.