CAPÍTULO I
Disposições Gerais
ARTIGO 1.º
Objecto
A presente Lei tem por objecto o estabelecimento do regime jurídico sobre o exercício da advocacia em Angola, a definição dos actos próprios dos advogados, bem como do regime da responsabilização pelo exercício ilegal da advocacia.
ARTIGO 2.º
Âmbito da Lei
- 1. A presente Lei aplica-se a todos os cidadãos que exercem a advocacia, como profissão liberal.
- 2. A presente Lei aplica-se também às diferentes formas de organização em que pode assentar o exercício da advocacia em Angola.
ARTIGO 3.°
Exercício da Advocacia
- 1. A advocacia, enquanto instituição essencial à Administração da Justiça, é exercida em regime de profissão liberal e rege-se pela Constituição da República de Angola, pela presente Lei, pelo Estatuto da Ordem dos Advogados de Angola e por demais legislação aplicável.
- 2. A advocacia e os actos próprios inerentes ao exercício da profissão só podem ser praticados por Advogados com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados de Angola.
- 3. Os cidadãos angolanos, mestres e doutores em direito, docentes de Instituições Angolanas de Ensino Superior, podem elaborar pareceres escritos remunerados, mesmo que não estejam inscritos na Ordem dos Advogados de Angola.
- 4. Considera-se exercício ilegal da advocacia, quando exercida por pessoas não qualificadas e tituladas nos termos do n.º 1 do artigo 22.° da presente Lei.
ARTIGO 4.°
Actos inerentes a advocacia
- A actividade profissional da advocacia compreende:
- a) O exercício regular do mandato e do patrocínio judiciário;
- b) A prestação de assistência jurídica, sob todas as formas permitidas,às entidades públicas e privadas que a solicitarem;
- c) A representação e a defesa, perante qualquer entidade, pública ou privada, dos interesses dos constituintes.
ARTIGO 5.°
Independência
O Advogado, no exercício da profissão, mantém sempre, em qualquer circunstância, a sua independência, devendo agir, livre de qualquer pressão ou coacção, especialmente a que resulte dos seus próprios interesses ou de influências exteriores, abstendo-se de negligenciar a deontologia profissional, no intuito de agradar ao seu cliente, aos colegas, ao tribunal ou a terceiros.
ARTIGO 6.º
Liberdade de exercício
Os Advogados e Advogados Estagiários com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados de Angola não podem ser impedidos, por qualquer autoridade pública ou privada, de praticar os actos próprios dos advogados, nem o seu acesso às instituições públicas pode ser negado por qualquer funcionário público, dentro dos limites legalmente estabelecidos.
ARTIGO 7.º
Título profissional
O título profissional de Advogado está exclusivamente reservado aos Licenciados em Direito com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados de Angola.
ARTIGO 8.º
Organização
- 1. O exercício da advocacia assenta em escritórios de advogados, singulares, em associação ou em sociedades de advogados.
- 2. Lei especial regula a constituição de Escritórios de Advogados em Associação e Sociedades de Advogados.
ARTIGO 9.º
Organizações internacionais
- Os Advogados podem integrar organizações internacionais de Advogados:
- a) Desde que não percam a sua individualidade e independência;
- b) Não se coloquem em situação de subordinação relativamente a essa organização;
- c) Sejam acautelados os demais requisitos legais sobre a publicidade da actividade e o próprio exercício da profissão de Advogado na República de Angola.
ARTIGO 10.º
Correspondência e cooperação entre Advogados
- 1. É permitido o estabelecimento de relações de correspondência e cooperação entre Advogados inscritos na Ordem de Advogados de Angola e Advogados estrangeiros, nos termos da presente Lei e dos Estatutos da Ordem dos Advogados de Angola.
- 2. A existência de relações de correspondência e cooperação entre Advogados inscritos na Ordem dos Advogados de Angola e Advogados estrangeiros, tem como base:
- a) A colaboração, em termos de clientela comum, que consiste no envio pelo correspondente exterior de clientes que, uma vez em Angola, passam a ser clientes do correspondente angolano, podendo ou não haver negociação entre os correspondentes, sobre honorários;
- b) A vinda de clientes do correspondente exterior acompanhados deste, que pode realizar reuniões fora ou no escritório do correspondente angolano;
- c) A troca de informações e intercâmbio profissional de natureza técnico-jurídica, nomeadamente de legislação, doutrina e jurisprudência.
- 3. Na situação referida na alínea b) do n.º 2 do presente artigo, a intervenção do correspondente exterior é sempre secundária, podendo apenas intervir a pedido e para complementar o correspondente angolano.
- 4. O contacto e assistência aos clientes locais têm que passar obrigatoriamente por Advogados autorizados a exercer advocacia em território angolano, não podendo os correspondentes estrangeiros estabelecer em território angolano qualquer tipo de contacto directo com instituições angolanas.
- 5. Os escritórios de Advogados angolanos não podem ter Advogados estrangeiros a trabalhar neles por tempo superior a trinta dias, nos termos definidos no n.º 3 do presente artigo.
- 6. Os Advogados, bem como as Sociedades de Advogados estrangeiros podem publicitar as suas relações de correspondência e cooperação com Advogados angolanos, podendo estes fazer o mesmo relativamente aos estrangeiros.
- 7. Os acordos de correspondência e cooperação devem ser depositados na Secretaria da Ordem dos Advogados de Angola, no prazo de oito dias, contados da data da assinatura dos mesmos.
ARTIGO 11.º
Incompatibilidade
- 1. O exercício da advocacia é incompatível com as funções seguintes:
- a) Presidente da República;
- b) Vice-Presidente da República;
- c) Magistrados Judiciais e do Ministério Público;
- d) Ministros de Estado, Ministros, Secretários de Estado e Vice-Ministros;
- e) Provedor de Justiça e Provedor-Adjunto;
- f) Governador e Vice-Governadores Provinciais;
- g) Governador e Vice-Govemadores do Banco Nacional de Angola;
- h)Funcionários dos Tribunais, da Polícia e dos Serviços equiparados;
- i)Quaisquer outras entidades que exerçam funções que, por lei, sejam incompatíveis com o exercício da advocacia.
- 2. As incompatibilidades não se aplicam aos que estejam na situação de aposentados, de inactividade, de licença ilimitada ou de reserva
- 3. Igualmente não estão abrangidos pelas incompatibilidades os funcionários e agentes administrativos providos em cargos com funções exclusivas de mera consulta jurídica e os contratados para o mesmo efeito.
ARTIGO 12.º
Impedimentos
- 1. Os Advogados estão impedidos de exercer o patrocínio e a assistência judiciárias:
- a) Quando o seu cônjuge ou algum ascendente, descendente, irmão ou afim nos mesmos graus, for juiz ou magistrado do Ministério Público, nos processos em que forem chamados a intervir;
- b) Quando eles próprios tenham intervindo nos mesmos processos nas referidas qualidades ou ainda como testemunhas, declarantes ou peritos;
- c) Quando tenham tido intervenção no processo ou em processos conexos como representantes da parte contrária ou quando lhe tenham prestado parecer jurídico sobre a questão controvertida;
- d) Em qualquer outro caso previsto na lei.
- 2. Para além dos impedimentos referidos no número anterior, estão igualmente impedidos de exercer o patrocínio e a assistência judiciárias em processos contra o Estado:
- a) Deputados à Assembleia Nacional;
- b) Membros das Forças Armadas ou Militarizadas no Activo;
- c) Membros dos Gabinetes dos Titulares dos Órgãos de Soberania;
- d) Membros dos Gabinetes dos Ministros de Estado, dos Ministros, dos Secretários de Estado, Vice-Ministros e equiparados;
- e) Directores Nacionais de Ministérios e de Secretarias de Estado e equiparados.
- 3. Estão ainda impedidos de exercer o patrocínio e a assistência judiciária, os titulares de cargos políticos e de direcção, a nível local, bem como os membros dos gabinetes destes e equiparados, assim como os titulares de cargos autárquicos.
CAPÍTULO II
Ordem dos Advogados
ARTIGO 13.º
Ordem dos Advogados
A Ordem dos Advogados de Angola é uma instituição de utilidade pública, independente dos órgãos de Estado, dotada de personalidade jurídica e de autonomia administrativa e financeira, regulando-se pelo seu estatuto e demais disposições legais aplicáveis.
ARTIGO 14.º
Inscrição na Ordem
- 1. Só podem inscrever-se na Ordem dos Advogados de Angola os nacionais angolanos titulares de um curso superior de direito, que reúnam os demais requisitos estabelecidos nos Estatutos da Ordem.
- 2. Os estrangeiros licenciados em direito pelas universidades angolanas podem inscrever-se na Ordem dos Advogados de Angola, desde que, nos respectivos países, os licenciados angolanos, em igualdade de circunstância, gozem do mesmo direito.
- 3. Os Advogados inscritos nos termos do número anterior não podem ser eleitos para os órgãos sociais da referida Ordem.
ARTIGO 15.º
Competência disciplinar
A competência disciplinar sobre os Advogados, pelos actos praticados no exercício das suas funções, cabe exclusivamente à Ordem dos Advogados de Angola, nos termos previstos no seu Estatuto.
CAPÍTULO III
Exercício do Patrocínio e da Assistência Judiciárias
ARTIGO 16.º
Patrocínio Judiciário
Sem prejuízo da nomeação de defensores oficiosos pelo Tribunal, só podem exercer o patrocínio judiciário os Advogados inscritos na Ordem dos Advogados de Angola.
ARTIGO 17.º
Mandato
O mandato para o exercício do patrocínio é conferido pela parte interessada, nos termos da legislação em vigor.
ARTIGO 18.º
Remuneração
- 1. Os serviços prestados pelos Advogados são remunerados pelos respectivos beneficiários, de forma livre, sem prejuízo da tabela de honorários estabelecidos pela Ordem dos Advogados de Angola.
- 2. O patrocínio exercido por nomeação oficiosa do tribunal é remunerado nos termos fixados pelo próprio tribunal e pela lei respectiva.
ARTIGO 19.º
Assistência judiciária
Só podem prestar serviços de assistência judiciária, os Advogados inscritos na Ordem dos Advogados de Angola, cuja remuneração é regulamentada em diploma próprio.
CAPÍTULO IV
Actos Próprios dos Advogados
ARTIGO 20.º
Actos próprios dos Advogados
- São actos próprios dos Advogados:
- a) O exercício do mandato forense em qualquer tribunal, incluindo os tribunais arbitrais;
- b)A consulta jurídica a entidades públicas e privadas;
- c)A elaboração de contrato e a prática dos actos preparatórios tendentes à constituição, alteração ou extinção de negócios jurídicos, designadamente os praticados junto das entidades reguladoras públicas, de Conservatórias e Cartórios Notariais, Órgãos da Administração Central. Administração Local e Administração Autónoma;
- d)As negociações tendentes à cobrança de créditos;
- e)O exercício do mandato no âmbito de actos administrativos ou tributários;
- f) Acompanhamento de clientes a reuniões e entrevistas com quaisquer autoridades.
- 2. Consideram-se actos próprios dos Advogados os que, nos termos das alíneas anteriores, forem exercidos no interesse de terceiros e no âmbito de actividade profissional, sem prejuízo das competências próprias atribuídas às demais profissões ou actividades cujo acesso ou exercício é regulado por lei.
ARTIGO 21.º
Escritório de procuradoria ou de consulta jurídica
- 1. Com excepção dos escritórios ou gabinetes compostos exclusivamente por Advogados, é proibido o funcionamento de escritório ou gabinete, constituído sob qualquer forma jurídica, que preste a terceiros serviços que compreendem, ainda que isolada ou marginalmente, a prática de actos próprios dos Advogados.
- 2. A violação da proibição estabelecida no número anterior confere à Ordem dos Advogados de Angola o direito de requerer junto das autoridades judiciais competentes o encerramento do escritório ou do correspectivo gabinete, sem prejuízo de procedimento criminal.
ARTIGO 22.º
Crime de exercício ilegal de profissão
- 1. A prática de actos de advocacia, incluindo a visita e o aconselhamento de clientes em território angolano, visando a prática profissional de actos próprios dos Advogados, em violação ao disposto na presente Lei, constitui crime de exercício ilegal de profissão titulada e é punido nos termos da Lei Penal.
- 2. Os auxiliares ou colaboradores da prática de actos ilegais de advocacia são punidos nos termos da Lei Penal.
- 3. A Ordem dos Advogados de Angola tem a particular obrigação de recorrer aos instrumentos legais adequados para reprimir o exercício ilegal da profissão de advogados por cidadãos nacionais e estrangeiros, não inscritos na referida Ordem Profissional.
ARTIGO 23.º
Publicidade de actos próprios de Advogados
- 1. É proibida a promoção, divulgação ou publicidade de actos próprios dos Advogados, quando efectuada por pessoas, singulares ou colectivas, não autorizadas a praticar os mesmos.
- 2. Os representantes legais das pessoas colectivas ou os sócios das sociedades irregularmente constituídas respondem solidariamente pelo pagamento das multas respectivas.
ARTIGO 24.º
Exercício da advocacia e regime de subordinação
- 1. Os Advogados de empresas que exerçam a sua actividade profissional em regime de trabalho subordinado, gozam dos mesmos direitos e estão sujeitos aos mesmos deveres legais e deontológicos, estabelecidos para os demais Advogados em regime liberal, e o contrato de trabalho por eles celebrado não pode afectar a sua plena isenção e independência técnica e científica perante a entidade patronal, nem violar o Estatuto da Ordem dos Advogados de Angola.
- 2. O exercício da consulta jurídica em regime de exclusividade para os serviços em que se encontram integrados, por licenciados em direito que exerçam a profissão como juristas em regime de trabalho subordinado, ainda que em tempo parcial, não obriga à inscrição na Ordem dos Advogados de Angola.
CAPÍTULO V
Procedimento Criminal e Responsabilidade Civil
ARTIGO 25.º
Procedimento criminal
- 1. O procedimento criminal por exercício ilegal da profissão de advogado pode ser requerido por qualquer interessado ou pela Ordem dos Advogados de Angola.
- 2. A Ordem dos Advogados de Angola como interessada pode, nos termos da Lei do Processo Penal, requerer a sua constituição como assistente no processo-crime que vier a ser instaurado contra a entidade que pratique ilegalmente actos próprios dos Advogados.
ARTIGO 26.º
Responsabilidade civil
- 1. A Ordem dos Advogados de Angola tem legitimidade para intentar acções de responsabilidade civil, tendo em vista o ressarcimento de danos decorrentes da lesão dos interesses públicos que lhe cumpre assegurar e defender nos termos dos respectivos estatutos.
- 2. As indemnizações que forem pagas nas acções previstas no número anterior revertem para um fundo destinado à formação dos Advogados e a outros fins de interesse da classe.
CAPÍTULO VI
Disposições Finais
ARTIGO 27.º
Revogação
- 1. É revogada a Lei n." 1/95, de 6 de Janeiro.
- 2. É revogado o n.º 2 do artigo 7.º da Lei n.º 16/16, de 30 de Setembro - Lei das Sociedades e Associações de Advogados.
ARTIGO 28.º
Dúvidas e omissões
As dúvidas e as omissões resultantes da interpretação e da aplicação da presente Lei são resolvidas pela Assembleia Nacional.
ARTIGO 29.º
Entrada em vigor
A presente Lei entra em vigor à data da sua publicação.
Vista e aprovada pela Assembleia Nacional, em Luanda, aos 31 de Janeiro de 2017.
O Presidente da Assembleia Nacional, Fernando da Piedade Dias dos Santos..
Promulgada, aos 27 de Fevereiro de 2017..
Publique-se..
O Presidente da República, José Eduardo dos Santos.